Sugestão de leitura: Quem perde, ganha!

Imagem da capa do livro: Fundo verde com quatro quadrados com desenhos de cada história. No alto da capa, a esquerda, a imagem de uma maria fumaça sorridente. No canto direito, desenho de um espantalho de chapeu preto, camisa vermelha e calça azul, preso num mastro sobre uma grama verde. No canto inferior esquerdo, uma menininha pequena de vestido branco e trancinhas, zangada de braços e pernas abertas, enquanto voa ao redor dela o berço, um sapato, um vestido e uma boneca. No canto inferior direito, um desenho de um boto (especie de golfinho) sorrindo para uma estrelinha também sorridente. No centro da página, em letras grandes brancas: ANA MARIA MACHADO - QUEM PERDE GANHA - DESENHOS DE CLAUDIUSLogo que perdi a audição, eu era relativamente pequena – tinha pouco menos de 10 anos completos – e minha mãe não sabia muito bem como “compensar” a situação que eu estava passando. Esse compensar é uma coisa que acho que só mães são capazes de entender, mas acho que ela queria que eu ficasse menos triste, não sei.

Talvez porque eu sempre tenha sido uma criança alegre e ela não queria que eu perdesse essa alegria.

Uma das coisas que eu fui obrigada a fazer, e já contei isso aqui, foi a aprender a ler. Claro que eu já era alfabetizada com essa idade. Mas ler era algo que eu detestava fazer e, por conta disso, era péssima em interpretação de textos.

Num belo dia, depois de várias peregrinações por médicos e mais médicos, em busca de um diagnóstico para a minha surdez súbita – o que foi complicadissimo, já que ninguém nunca tinha visto um caso como o meu e tampouco sabia dizer se a surdez era temporária ou irreversível – minha mãe viu que eu estava cansada e desanimada, me levou para passear e entramos numa livraria. O que antes era um lugar que eu detestava ir, passou a ser um dos meus lugares favoritos. Minha mãe disse que eu poderia escolher alguns livrinhos, para passar o tempo (porque eu realmente ficava horas e horas e horas na sala de espera do médico ou do laboratório de exames).

Um desses livros, escolhidos totalmente ao acaso se chamava “Quem perde, ganha”, de Ana Maria Machado, com quatro pequenas histórias que ensinam sobre perdas à crianças. Nada que falasse do tipo de perda que eu estava sofrendo. Mas perdas do tipo separação da família, objetos que não servem mais, pessoas que passam pela vida e não ficam, coisas assim.

Eu não sei dizer porque escolhi esse livro – deve ter sido alguma coisa inconsciente, do tipo que Freud explica – e ele se tornou um companheiro, junto com vários outros livros e revistas em quadrinhos, durante esse primeiro ano de surdez e constantes transformações.

Depois de um tempo, o livro sumiu (perdi ou doei, nem sei), mas eu nunca esqueci das histórias. Elas ficaram marcadas como lembranças indeláveis da minha infância…

Ontem, eu estava fazendo hora e entrei numa livraria da Martins Fontes, totalmente sem propósito. Só queria mesmo matar o tempo até o meu compromisso agendado dalí alguns minutos. Qual não foi a minha surpresa de me deparar com um livrinho infantil com o título “Quem perde, ganha”. O engraçado é que eu reconheci os desenhos da capa e não o título do livro.
Peguei o livro nas mãos, dei uma folheada, pensando “olá, velho amigo!” e abri as páginas absurdamente familiares, com aquelas histórias que ficaram marcadas desde aquela época. Minha favorita é a da menina que não entende porque as roupas e sapatos dela somem, mesmo que ela ganhe outras roupas e sapatos novos. Ela fica muito braba com isso até o dia que perdia a paciência e caia no choro. E a mãe vinha explicar que elas sumiam porque eram doadas para outras crianças, pois não serviam mais nela.

Tive que segurar o choro (alias, faço isso agora também, enquanto escrevo) ao ler pequenas passagens do livro…

Fechei-o com carinho, devolvi-o à estante e sai da loja. Mas mal dei dois passos e algo mais forte que eu me fez retornar à livraria e trazê-lo para casa!

Em cima da minha mesa está um exemplar do livro. Tão antigo que ele sequer tem código de barras e o vendedor teve que digitar o nome na tela, para poder fazer a nota dele.

Indico esse livro, não apenas porque foi importante para trabalhar a minha perda. Mas porque ele o faz de maneira doce e poética, tal como gosto de escrever aqui no DNO. Uma indicação de leitura aos papais e mamães de pequenos que tem a mesma perda auditiva que eu. E também aos grandinhos que ficaram curiosos com as histórias. Valem a pena!

Beijinhos sonoros,

Lak

p.s. como o livro é antigo e não sei em que edição está, acho provável que seja mais fácil encontrá-lo em sebos. Sugiro o site Estante Virtual, que é  onde costumo comprar os livros antigos que procuro.

14 Resultados

  1. Lia disse:

    Gostei muito da dica. Acho importantíssimo esse trabalho psicológico sobre as perdas nas crianças, pois isso prepara para a vida e os ajuda a serem mais felizes convivendo com o fluxo de ganhos e perda da vida, o que é natural, mas que muitas vezes não sabemos lidar. Uma vez eu vi no parquinho de uma creche a seguinte frase: “É brincando que a criança aprende que perder também faz parte da vida.” 😉

    • Avatar photo laklobato disse:

      Sim, é importante mesmo. E como precisei aprender isso na prática, o livro acabou me ajudando muito. Atesto que ele é util hehehe
      Vc trabalha com crianças, Lia?
      Beijos

  2. Lia disse:

    Não, ainda não, quem sabe um dia… hehehe. Mas eu me identifico e me sensibilizo com tudo o que se relaciona as crianças, tudo o que vivemos na infância determina de forma irremediavel os obstáculos que teremos na vida, principalmente nos aspectos psicológico e espiritual. Então vamos cuidar bem das nossas crianças, principalmente da nossa “criança interior”, pq são nelas que estão o lado puro, alegre, inocente, sensível, delicado e belo da vida… ninguém é feliz vivendo só o seu lado adulto…né verdade ^^

  3. Andrea Prado disse:

    Lak,
    Que ele fique aí o tempo que precisar e quem sabe seja doado para alguém que precise dele..quem sabe.
    Só o tempo dirá…
    Beijos

  4. Eliane disse:

    Puxa Lak…que lindo.
    Essa coisa louca de mãe querer compensar é isso que vc falou, na verdade queria que vc não ficasse tão triste, não perdesse sua alegria. O que tb sei que não é fácil diante de um tranco desse porte mas, a vida pode nos surpreender quando menos esperamos. Trabalhar perda, na verdade trabalhar “desapego”é o exercício mais difícil de todos e o mais necessário…ótima dica sua, esse livrinho, deve ter sido um encontro e tanto ontem de vcs 2, vc e o livrinho. Livros, são grandes Mestres, alguns em especial!!! Como sempre vc me deixando com a emoção a flor da pele. Amo vc muito. 😡

  5. Kali disse:

    Os livros da Ana Maria Machado são uma delícia! Eu vi esse livro uma vez e me ressinto até hoje por não tê-lo comprado… vc agora trouxe essa lembrança… acho que vou procurá-lo novamente! 😀

  6. Rodolpho disse:

    Legal a sugestão, lak.
    e por falar em sugestão, assisti aquele filme, o milagre de ana sullivan, da helen keler, que você falou pra mim uma vez, faz uns dias. não assisti todo porque não deu tempo, mas achei impressionante.

  7. Gilberto Venske disse:

    Oi Lak

    Apesar de não deixar comentários, gostaria de dizer que sou frequentador assíduo do teu Blog.
    Estou me preparando pra fazer meu IC, a cirurgia vai ser no começo de novembro próximo, vai ser feita em Florianópolis-SC.
    Gostaria de te dizer que você foi meu maior incentivo para fazer o implante.
    Aprendi a valorizar muitas coisas com você.. Obrigado por tudo.

    Um grande abraço

    Gilberto Venske
    Itapema – SC

    • Avatar photo laklobato disse:

      Sinto-me honrada pelas suas palavras. E espero, de coração, que o IC corresponda todas as suas expectativas!
      E, se tiver alguma dúvida que eu possa ajudar a esclarecer, avise! No mais, boa sorte com a cirurgia e volte para contar como foi, por favor. Estarei mentalizando por você!
      beijão

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