Ai, que praga, viu?

Domingo à noite, antevéspera de feriado. Milhares de empresas decidem emendar o feriado também na segunda, não tive essa sorte e trabalho amanhã. Mas, para o bem de todos e felicidade geral da nação da internet, quando fico chateada, desembesto a escrever.Como não consigo pensar em muita coisa além de trabalho (e em oitocentos buzilhões de xingamentos ao ser humano que decidiu que se trabalha em véspera de feriado) decidi falar um pouco de como a deficiência, que na maioria dos casos atrapalha a vida profissional de uma pessoa, também pode ser um diferencial.

Eis que uma tarde qualquer, tinha saído mais cedo do trabalho, não me lembro por que razão. Estava na casa da minha mãe, morgando em frente ao computador, quando ela aparece na minha frente e diz:

– Lak, B. (meu ex-namorado) está aqui no telefone querendo falar com você. Pediu pra você entrar no MSN pra falar com ele.

Achei esquisitíssimo, porque não é sempre que ex-namorado inventa de me ligar, mas estamos aí, sou uma boa pessoa…=P

Ligo o MSN e vasculho na minha lista de amigos. Não, ele não estava dentre os listados. Havia-o apagado nem sabia quando. A sorte é que tenho uma memória absurda pra dados inúteis e sabia o endereço dele de cor. Digitei B.blablabla@hotmail.com e logo em seguida, ele fica online pra mim e vem conversar comigo:

– Lak, tudo bem? Como você está?

(e seguiu-se uma conversa educada e apressada, porque estava mais interessada de saber o que ele queria do que em jogar conversa fora, propriamente dito).

– Então, lembra do meu amigo, o André? Ele está trabalhando na pós-produção de um filme do Mojica (José Mojica Marins, mais conhecido por seu personagem Zé do Caixão) e a produtora está precisando de alguém pra fazer leitura labial de um material. Posso dar seu contato pra ele?

E eu:

– Uau, claro! Adoro cinema!

E a conversa morreu por ali mesmo.
Pouco tempo depois, recebo um email:

A Praga (1980) – pôster oficial

“Prezada Lak, estamos fazendo a pós-produção de um filme antigo do Mojica, cujo áudio não chegou a ser gravado. Será que você poderia nos ajudar fazendo a leitura labial das cenas que foram gravadas?”

E explicou que além de não terem gravado o áudio, o roteiro tinha sido perdido, portanto a leitura labial dos atores era a única maneira de manter o diálogo o mais próximo do original.

Descobri também que o André, o que me indicou, era Diretor de Fotografia do filme (da equipe que trabalhou em 2007, já que o filme foi rodado em 1980)

Fiquei empolgadíssima com a oportunidade. Marcamos pro dia seguinte – um sábado – no final da tarde.

Foram 8 horas de trabalho, pra um filme de aproximadamente 80 minutos, já que muitas cenas estavam desfocadas, com atores olhando pra tudo que é direção ou filmados de longe.

O resultado ficou bastante satisfatório e cheguei a voltar uma vez, pra completar algumas cenas que não estavam inseridas da primeira montagem.

Pude conferir o trabalho na Mostra de 50 anos de carreira do Mojica, no Espaço Banco do Brasil, em novembro de 2007.

Afinal, cheguei a conhecer pessoalmente o Mojica, que me deu um livro autografado…

Com Mojica, na Mostra José Mojica Marins - 50 Anos de Carreira.

Com Mojica, na Mostra José Mojica Marins – 50 Anos de Carreira.

O filme se chama “A Praga”, daí o título do post!

Tempos depois, cheguei a dar busca no Google, pra ver se meu nome aparecia nalgum lugar – afinal, não é sempre que a gente fatura uma graninha usando nossos dotes de PcDs (pessoa com deficiência) – mas infelizmente, não cita meu nome, os textos que falam desse trabalho se limitam a referir-se a mim como “o áudio foi recuperado por leitura labial com a ajuda de uma deficiente auditiva”.

Mesmo assim, não é todo dia que a gente se dá conta que aquela frase de Caetano Veloso está certíssima, quando diz: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.

Beijinhos,
Lak

P.S.: Alguns veículos citaram o meu trabalho:

 

 

5 Resultados

  1. Renata disse:

    Como vc reclama… vc tem ate msn no trabalho! 🙂

  2. Renata disse:

    Agora que vi o “leia mais” embaixo e pude ler o post 😀 Como assim, ele não tinha unhas enormes?!

  3. Avatar photo laklobato disse:

    Rex, só no polegar, a cargo de manter o charme do personagem. O Mojica foi obrigado a cortar as unhas, porque estava perdendo a sensibilidade e o movimento dos dedos, por conta da unha comprida.
    Quando o conheci, ele ainda estava em fisioterapia e era perceptivel a dificuldade de segurar coisas pequenas, como caneta, por exemplo.

  4. Zentiiii que inveja de você Tia hahahahaahahahhaah
    Super, master, mega, hiper, ultra fã dele hehehehe
    Mas ism surdez tem seu diferencial e já me salvou de me
    envolver em muita fofoca viu? Hahahah tipo ” Mas Diéfani você estava lá
    você OUVIU” ai eu ” Ah meu filho eu não ouvi NADA e você sabe que realmente não ouvi”
    hahahahhaha um babado só.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Me disseram que ai nos EUA ele é bem mais famoso e cultuado do que aqui. Você confirma?

      Hahahaha já saquei muuuitas dessas: “Eu? Eu não ouvi naaaaaaada…” Quem pode pode!

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