Ao mestre, com carinho.
Lidar com crianças com deficiência não é nem mais fácil nem mais difícil do que lidar com uma criança comum, apenas requer vontade de aprender com ela, tempo e paciência, coisa que qualquer criança precisa. Mas, o que muitas pessoas esquecem é que não basta ensiná-la a ser uma criança como as outras, é preciso ensiná-la também a como lidar BEM com a sua limitação. Sou da opinião que crianças são esponjas do comportamento de adultos. Se você ensiná-la que ela precisa superar suas limitações e ir além, ela o fará. E, se você ensinar que ela é uma coitadinha, ela irá crer nisso, possivelmente o resto da vida. É uma tarefa fácil? Não, mas educar outro ser humano nunca é. Mas, segundo praticamente todas as pessoas que conheço, que tem filhos, é um trabalho que vale a pena…
Pensando na educação de crianças com limitações físicas e sensoriais, pedi pra um amigo (o autor do blog Olhares Dispersos), que tem bastante experiência com educação inclusiva, contar como é o ‘aprendizado’ diário de ensiná-las. Lições que vão além do didático, que evocam a formação do caráter. Eu aprendi muitíssimo com meus professores. Tanto aqueles que me tratavam como uma aluna como qualquer outra, quanto aqueles que me desafiaram. Só não tive oportunidade de aprender com aqueles que simplesmente não estavam dispostos a ensinar. Mas, felizmente, esses foram minoria no meu caminho.
Sou professor a mais de 10 anos (estou ficando velho), nesse tempo dando aula já tive todo tipo de aluno. Alunos altos, baixos, espertos, tímidos, arredios, violentos, com qualquer característica que se possa imaginar. Nesse tempo todo também trabalhei com alunos com necessidades especiais. E aqui o termo necessidade especial é mais verdadeiro do que politicamente correto. Muitos deles não podem ser chamados de deficientes, simplesmente porque não são, eles apenas possuem características diferentes.
Minha primeira experiência foi com dois alunos cegos, numa escola estadual no bairro da Vila Mariana. Eu dava aulas de ciências e eles estavam na oitava série. Usavam uma régua para a escrita e anotavam tudo o que eu falava. Tinham o livro em braile e um material com pranchas em plástico injetado com as imagens, tudo em alto relevo. Bastante interessante. Eles eram interessados, faziam o que todo mundo fazia e por vezes eu até esquecia que não enxergavam, só não podia deixar de detalhar bem o que desenhava na lousa e as aulas de laboratório em muitos casos eram totalmente narradas para eles.
Faziam as mesmas provas, tinham os mesmos resultados da turma e sempre tinham as suas perguntas. Eram parte do grupo e como tal participavam de todas as brincadeiras que rolavam, ora sendo alvos ora sendo os que começavam as brincadeiras. Nunca ninguém os menosprezou ou os tratou por coitados. Eram apenas mais dois alunos ali no meio.
Isso foi a uns 10 anos atrás, hoje voltei novamente a ter alunos com algum tipo de deficiência, a grande maioria independentes. Uma das unidades da escola em que trabalho possui cerca de 15 deficientes auditivos em cada série, todos ficam na mesma sala e tem um tradutor junto com o professor. O tradutor funciona mais para os professores do que para os alunos, estes em sua maioria fazem leitura labial também (perguntei pra um dos alunos dessa escola que trabalha na secretaria da minha escola como a coisa funciona).
Até por muitos morarem e trabalharem juntos, não se isolam num grupinho restrito, como meus dois alunos cegos iniciais, estes também fazem parte do grupo, zoam como qualquer aluno. No fundo é essa a ação que eu espero de uma pessoa, que ela seja sempre ativa, busque a sua independência dentro de seus limites e não vire escravo de uma deficiência, sendo assim alguém com necessidade especial e não deficiente.
Falo isso com pesar, pois tem um dos meus alunos, um jovem de uns 12 anos, que se fez escravo de seu problema. A patologia que ele tem me foge o nome, mas ele é cadeirante, apresenta problemas de coluna também. Desde que o conheci, quando chegou a unidade em que trabalho, na quinta série, sempre vi o ar derrotado.
Para chegar a sala, a mãe o traz, para o intervalo, os amigos o carregam, para ir a qualquer local da escola, alguém o leva. Certo dia perguntei se ele tinha problemas nos braços ou algo do gênero para os professores dele (eu fico só no laboratório de ciências e em projetos). Nenhum problema, ele apenas não empurrava sua cadeira. Quando teve sua primeira aula comigo, não deixei que o empurrassem, disse que ele tinha que saber se locomover sozinho e empurrar a própria cadeira.
Minha supresa foi saber que ele nunca tinha empurrado a própria cadeira, demorou mas chegou ao laboratório. Descer escadas era um problema a parte, sempre pedia que o tirassem da cadeira e o carregassem no colo. Comigo não, tem que ser descido, é claro, mas em cima da cadeira, afinal imagina um dia ele na rua pedindo ajuda, será que encontraria gente disposta a tudo isso?
Nas minhas aulas ele vem empurrando sozinho já e já se prepara para descer as escadas, pena que só nas minhas aulas. É comum vê-lo pedir pra ser empurrado até que me encontra e sai empurrando a própria cadeira. Aliás, quando ele começa com essa de ser super protegido já falam pra ele, vou chamar o professor Alex e ai ele se locomove.Espero que um dia ele cresça e perceba que ele só tem uma necessidade diferente, deixe de se ver como um coitadinho e passe a se enxergar como um ser humano completo.
É por gente assim que o mundo não se torna um lugar frio e inabitável. Que deixam de ser chamados de meros professores para ganhar o título de MESTRE.
Beijinhos
Lak
Eita Lakinha eu amo essas suas historias,e realmente são pessoas assim que tornam esse planeta melhor e não deixa a nossa esperança morrer.
Eu estou em divida com meu blog, mas n deixei de lado não, é que eu estou em BH sabe? Ai fica dificilzinho pra postar!!!!
Beijoooooos
Hehehe sim, tem gente que dá aula e tem gente que nos ensina a viver….
Não se preocupe com o blog, curte a aula… Viu que falei de vc no post de ontem?
Beijos
Professor, mas professor mesmo, esses com P maiúsculo podem mudar uma vida, né?! Sorte de quem encontra um desses pelo caminho….mais sorte ainda de quem consegue perceber que encontrou um!
Beijos!!
Hehehe verdade!!
Beijinhos
Linda história! Parabéns ao mestre, que não ensina apenas sua disciplina, mas nos mostra o mundo e nos ensina a sermos pessoas melhores. Admiro demais quem consegue educar com tanta paixão.
Bjs
Eu também, Bruna!! Por isso pedi o depoimento dele!
Beijos
Oi querida, eu acho tão bacana ver que as crianças, que não são influenciadas por adultos, mantém a inocência e o coração puros, longe de preconceitos e olhares diferentes.
Parabéns para esse professor, que tem essa visão!!!
Bjokas 😀 🙁 😛 😐 😉 😳 ( adoro esses sapinhos…..)
Oieee Lak, td bem!?!??! ta friuzunho por ai!?!?
Esse negocio de se fazer de coitadinhoo, nao da muitooo certo nao.. Eu era assim, até q entrei na faculdade.. Uma GRANDE pequena amiga, ela me ensinou ver o mundo diferente, a me amar mais do geito que sou.. eu nao me aceitava ser deficiente, ser diferente, nao ouvir, eu pensanva q eu sendo assim nao teria amigos, paquera… mas essa grande e pqna amiga abriu meus olhos.. me ensinou q a vida nao é só cor de rosas.. Tenho ela como uma irma.. tenho amizade com ela ate hj.. e sempre agradeço a Deus por ter colocado ela no meu caminho pra me ensinar a viver!
Hj ela fala q eu nao sou mais a Regiane q ela conheceu no 1° dia de aula!!!
Bjinhus..
sim, mestres de verdade não se resumem a professores. Tive amigos e exemplos que me ensinaram muito, que me incentivaram a ser a pessoa que sou hoje. Acho que mesmo sem ter uma deficiência, a gente se perde ao longo do caminho e, sem a ajuda dos outros, muitos de nós não conseguiriam ver tão longe.
Que bom que você tem se aprimorado constantemente!! Que bom que você tem uma amiga tão maravilhosa.
Beijinhos,
Algumas pessoas são tão especiais que não tem como passar em branco e concordo com vc Lak, esses merecem verdadeiramente o título de mestre!!!
Prof. Alex, agradecemos por fazer a diferença, na dura arte de formar cidadãos!
Bjossss!!!!!!
** hj no meu blog tem um post matrixiano, passa la!!!
bacana, Lak!!!
queria mesmo que professores dispostos também fossem bem remunerados… o problema é que existe pouco estímulo… não justifica má vontade de ninguém, claro, mas alunos e professores qdo são valorizados, rendem mais… coisa óbvia, né… (pelo jeito nem tanto pra quem é responsável por planejamento de política educacional…)
Parabéns pra esse professor amigo seu!… de fato, ele sabe ensinar!
beijos!
Olá, tudo bem, ?
Gostei do seu blog pode me enviar o seu email para o contato comigo pois sou surdo também.
Parabéns.
Prof. Neivaldo
Oi Lak !!! Td bem ?? Saudades…
Esse assunto me é bem familiar, já que trabalho com alunos com necessidades especiais. Apesar de minha especialidade ser na área de necessidade intelectual, já tive aluno com deficiência auditiva (ela lê lábios) e cadeirante. E posso te dizer com propriedade, que o maior problema está na família. Se a família aceita a deficiência, seja ela qual for, a criança cresce com naturalidade. O que não acontece com tanta frequência , não é mesmo ? Nós professores, fazemos a nossa parte (e olha que tem muito mais professores dispostos a ajudar do que se pensa…), mas com o apoio familiar tudo fica muito mais fácil, independente de se ter deficiência ou não… Somos como uma gota no oceano, mas de gota em gota, podemos fazer a diferença na vida de quem souber aproveitar ou entender a lição… Bjo (tô sempre lendo seu blog, viu?)
Sempre concordo com você. Professor é um complementar importantissimo, mas é a família que forma a base do caráter. São os pais quem devem ensinar o filho que ele não é um coitado, porque isso caleja.
Mas, de qq forma, o trabalho de vocês não é menos importante… Ainda bem que existe pessoas como você e o Alex!
Beijinhos