Contratando um surdo oralizado
Vez em quando, alguém vem me confidenciar sobre situações inusitadas em relação a ser surda oralizada.
Antes de tudo, embora eu esteja careca de saber que a maioria dos leitores sabe de cor e salteado O QUE SIGNIFICA ser surdo oralizado, vou me repetir, caso alguém ainda não saiba:
“Surdos oralizados: São pessoas com deficiência auditiva que, apesar de nem sempre ouvirem bem o suficiente, a ponto de discriminar com clareza a fala sem apoio da leitura labial, nem mesmo com aparelhos, falam normalmente (ainda que com sotaque típico) e se comunicam valendo-se da leitura labial. São pessoas que perderam a audição depois da aquisição da fala (também chamados desurdospós-linguais) ou cujos pais acreditaram na oralização por meio da fonoterapia. O que os diferencia dos deficientes auditivos de graus mais leves é justamente o fato de serem incapazes de discriminar a fala auditivamente, mesmo utilizando próteses auditivas.”
Alguns fazem uso também da Língua de Sinais, outros preferem somente o português falado e escrito.
E mesmo dentre os que falam a Libras, o domínio dessa modalidade de comunicação pode variar. Alguns são fluentes e usam a Libras como forma complementar da sua comunicação. Outros, utilizam o idioma apenas para se comunicar com outros surdos, de modo a poder ajudá-los e para ampliar a gama de amigos, mas não utilizam a língua de sinais como uma forma de comunicação válida para si. Ou seja: quando se trata de ter acesso a alguma mídia com áudio, preferem a legenda em português. E, quando vão falar com ouvintes, querem usar tão somente o português, visto que é esta a sua língua materna e sua forma de comunicação preferida.
Assim como os surdos usuários da Libras querem o direito de ter tudo acessível na sua língua materna, os oralizados também querem esse direito: usar prioritariamente a língua portuguesa falada e escrita.
A única coisa que eu acho ruim na divulgação da Libras – e não, ao contrário do que pensam, sou totalmente a favor da divulgação máxima da LINGUA DE SINAIS, para quem quer e usa – é que esquecem de divulgar que nem todo deficiente auditivo a tem como lingua materna, principal idioma ou total fluência ou interesse em se comunicar através dela, especialmente com ouvintes.
Sendo assim, o que as empresas devem saber quando contratam e se dispõem a oferecer acessibilidade real a um surdo oralizado:
1. O principal idioma de um surdo oralizado é o português. Logo, ele sempre vai preferir acessibilidade através desse idioma, nas formas faladas e escritas.
2. A maioria não tem condições de falar bem ao telefone, portanto cabe à empresa fornecer acessibilidade por email, chat e outros meios de comunicação, tais como videoconferência.
3. Pergunte o que a pessoa em questão precisa para que se facilite a comunicação com ela: que falem mais alto, que falem mais devagar, que falem virado sempre pra ela, etc. E repasse essa informação aos demais funcionários.
4. Durante uma reunião ou conversa em grupo, procurem falar sempre voltado para a pessoa com deficiência auditiva e, preferencialmente, falando apenas uma pessoa por vez. Ou, quando possível, que alguém se disponha a repetir o que foi dito, para esclarecer eventuais dúvidas. Intérpretes de Libras ajudam, mas somente se a pessoa tiver afinidade com o idioma. Não tentem impor que ela “deveria aprender Libras porque alguém disse que é melhor assim”. O uso ou não-uso da Libras é uma escolha individual que deve ser respeitada, quando se trata de uma pessoa adulta.
5. Se o empregador não confia que a pessoa entende sempre a tarefa solicitada pela leitura labial – não sei porque inventam de questionar isso, até ouvintes cometem equívocos às vezes, mas tudo bem – passem a tarefa por escrito, em português. Quem não tem fluência em Libras não vai se sentir mais confortável tendo que traduzir algo explicado em outro idioma. Libras não é uma forma de comunicação nem português-dito-em-mímicas, é um idioma completo, inteiro e independente do português. Precisa ser aprendido como qualquer idioma, não brota automaticamente na cabeça de alguém, só porque a pessoa perdeu a audição.
Pessoas, se alguém lembrar de mais alguma dica útil aos empregadores, me avisem que edito o post.
Beijinhos sonoros,
Lak
Uma dica útil, sei que não são todos que passam por isso:
Quando precisar chamar o surdo oralizado à distância, chame alguém próximo a este e peça para chamá-lo. Quando estiver próximo, encostar já basta, não é necessário bater ou cutucar.
É extremamente irritante quando você é alvejado por objetos simplesmente para te chamarem.
Se eu lembrar de outra dica, comentarei aqui.
Um grande abraço.
Excelente, Lobo. Isso é realmente bem chato mesmo!! Beijos
Lak, existem empresas que têm interfones ou vidros temperados. Que o empregador facilite para o(a) surdo(a) oralizado(a), que não precise atender isto e consiga entrar. Necessária é a cooperação entre os colegas de trabalho.
Boa sugestão!!
Beijos
Excelente Texto Lak! Lembrei de algo similiar à contratação de um intérprete que é quando uma pessoa senta ao seu lado ou vice-versa e digita tudo o que está sendo dito numa reunião, palestras, treinamentos e afins. Tem um nome pra esse profissional, que no momento me foge à memória.
Beijos!
Estenotipista… beijocas
Demais Lak…
Beijos
lark,,tenho uma dúvida……os surdos oralizados são todos pós lingual?
porque meu filho sabe libras,mas meu grande sonho é a oralizacão, ele foi implantado aos doze e hoje vai fazer 16………..fala muitas palavras, mas não entende quase nada quando falam com ele……por isso as libras q ele aprendeu aos doze, faz fono 2 vezes por semana. bjs
Alexsandra,
sendo sincera, uma fono poderia te responder isso muito melhor que eu, mas já que foi pra mim que você perguntou…. Voilà…
Existe muito, mas muito mesmo, oralizados pré e perilinguais (que perderam a audição até os 6 anos). Quando implantados cedo, não tem sotaque na maioria dos casos, mas muitos foram implantados tarde e outros usam próteses. Tem sotaque aqueles que tem perda mais profunda.
No entanto, a maioria teve a estimulação da oralização, mesmo que apenas usando aparelho comum, desde cedo (ou desde que perderam a audição).
Conheci alguns poucos casos de pessoas que foram oralizadas depois de implantadas tarde e outra que, apesar de não falar, aprendeu fluentemente o português escrito a ponto de ter plena compreensão tarde também.
Portanto, o que posso te dizer é que, apesar de ser mais difícil, mais raro e provavelmente acompanhado de sotaque, sim, é possível que ele se torne oralizado. Mas depende essencialmente da vontade DELE. É importante que isso não seja uma imposição sua, mas uma escolha dele, do contrário, ele pode se sentir desmotivado.
Ou seja, possível a oralização é, com algumas limitações, mas só será realmente possível se essa for a vontade do seu filho também.
Boa sorte com ele e um grande abraço.