Espaço do Leitor: A história de Bárbara
Resolvi criar uma nova categoria aqui no DNO: Histórias incríveis de leitores que nos privilegiam com suas histórias.
Essa história é de uma mocinha surda oralizada que comentou aqui no DNO esses dias. Ela contou sua história num comentário e pedi autorização para publicar como post, porque é uma história linda e interessantíssima.
Com a palavra, Bárbara:
Olá!
É a primeira vez que comento aqui, embora já conheça o blog há algum tempo.
Antes de comentar esse post, peço licença pra contar a minha história, porque acho que esse foi o primeiro espaço que encontrei pra isso na internet… pode? =D
Eu nasci com perda auditiva bilateral e neurossensorial, assim como meu irmão mais velho (só a minha outra irmã, a primogênita, não tem deficiência).
Quando meu irmão nasceu, ninguém sabia que ele teria essa deficiência. Demoraram anos pra descobrir. E foi uma época muito difícil, segundo minha mãe, porque a desinformação era grande. Chegaram até a dizer que ele era autista, e demorou para encontrarem uma boa fonoaudióloga que diagnosticou, enfim, a deficiência auditiva, quando ele já estava com quatro anos. Então ele começou a usar próteses e a aprender a falar e ouvir com sessões intensivas de fono.
Quando eu nasci, dois anos depois, minha mãe já soube identificar rápido que eu também tinha perda. A minha perda é moderada a severa em ambos os ouvidos, embora um deles ouça um pouquinho melhor que o outro. Sem aparelhos, não escuto muita coisa, só sons altos e bem próximos (a única exceção é som de trovão forte: quando tem durante a noite, acordo mto assustada, pq durmo no silêncio). Mas fui desde cedo treinada pra não ler lábios (embora eu use mto leitura labial quando estou ouvindo mal), e passei a usar próteses auditivas também com 1 ano de idade. Minhas primeiras palavras aprendi lendo lábios, mas depois foram anos de fono para que eu fosse constantemente estimulada a usar a audição. No fim das contas, escuto e falo com mto mais facilidade do que meu irmão, cuja perda é significativamente menor que a minha.
Foram anos com minha mãe falando com a gente escondendo os lábios, falando bem alto para que eu não me isolasse por não entender nada, mesmo em espaços públicos, quando todo mundo olhava pra ela como se ela fosse doida. Nas escolas tbm tive a sorte de ter professores bem atenciosos, quando ainda usava uma caixinha com receptor e a professora usava microfone (não lembro muito disso, no entanto). Minha mãe diz que a maior preocupação dela era que nós pudéssemos nos virar sozinhos, caso um dia ela não estivesse pra ajudar, e que pudéssemos nos tornar independentes.
Conto tudo isso porque acho que é uma pena que a deficiência auditiva seja vista como algo tão impeditivo, fazendo com que pais desistam logo de tentar educar seus filhos a ouvir. Pessoas com deficiência auditiva como a minha poderiam muito bem ouvir e falar como eu felizmente consegui (e não porque sou especial, mas porque tive oportunidade e muito apoio) ficam desestimuladas, e aí que essa parte de ouvir fica defasada mesmo nos nervos e cérebro. A dificuldade é muito maior, e não posso deixar de pensar que já o privilégio de ser de uma família com mais dinheiro e mais bem informada, e claro, bem disposta a lidar com aquilo. O fato é que até hoje quando vou fazer alguma audiometria com alguém que não conheço, a pessoa se surpreende, porque meu reconhecimento de fala e minha voz não batem com a perda apontada no exame. E não falo isso pra me gabar, de modo algum, espero que isso fique claro. Só quero dizer que acho que essa possibilidade, a de se insistir na oralização da pessoa com uma deficiência um pouco maior mas não absoluta, é muitas vezes relegada. E é estranho, porque em geral quero provar que sou capaz de ouvir, mas aqui agora estou me sentindo compelida a “provar” que não ouço, só pra validar meu testemunho, o que é uma bobagem. Só queria deixar meu depoimento e expressar a minha admiração por você, Lak, e por todos que passam por essas coisas. Tenho certeza de que perder a audição mais tarde na vida é um choque muito maior do que já nascer assim. E se adaptar ao implante coclear parece uma experiência incrível, ainda que muito difícil. Uma das meninas que apreceu em uma foto aqui, a Bia, estudou comigo. Lembro que na escola ela mal falava com todo mundo, embora fosse sempre muito sociável e simpática. Pouco tempo depois de nos formarmos, quando ela já tinha colocado o implante, a gente encontrou ela por acaso no shopping e ela foi jantar conosco. Que mudança!! Ela tava muito mais extrovertida, participante. Fiquei muito feliz mesmo, embora não fale muito mais com ela.
Finalmente a respeito do post, eu também sinto muita falta de CC e legendas, principalmente com programas e filmes dublados, já que o movimento labial é completamente diferente do som e isso me atrapalha. E só pra comentar sobre as músicas, porque li vários posts seus hoje, eu amo música, mas dependendo do volume e da qualidade do som, é uma experiência horrível. Música de fundo de shopping, por exemplo, eu nem percebo, apago, porque se fico prestando atenção, começa a me dar dor de cabeça, porque não consigo distinguir nada, esmo que conheça muito bem o som. Uma vez li sobre um cara que descobriu quais freqüências ele ouvia melhor ou não e ele equalizou as músicas de acordo com isso, e disse q foi então que finalmente conseguiu ouvir. Eu não sei como seria se eu fizesse isso, porque estou muito acostumada a ouvir música assim mesmo. Você poderia ouvir música usando fone de ouvido? Se sim, já experimentou? Eu ouço muito melhor assim (coloco o fone atrás do aparelho ligado na chave de telefone – um método bizarro meu). Outra coisa que acho curiosa é que sempre tiro os aparelhos pra nadar, claro, e não ouço muito na piscina. Mas no mar a diferença é incrível. Ouço mto bem! Será que é por causa das ondas, que propagam mais o som? Huahuahua acho que essa tese é um pouco ridícula, mas tudo bem.
Enfim, parabéns pelo blog, ele é mto bem escrito, sensível e inteligente.
Bárbara, adorei seu comentário e não resisti mesmo em transformá-lo em post…
Como te respondi no comentário, mais importante que dinheiro, foi o empenho e interesse dos seus pais em investir na sua oralização/reabilitação auditiva. Dinheiro pode comprar muita coisa, mas não compra dedicação, carinho e amor.
Por outro lado, enfatizo que os pais que optam pela Libras e se dedicam em aprender o novo idioma em prol da comunicação com o filho, também fazem um trabalho de coração.
Não existe escolha certa ou errada entre a oralização, a educação bilingue ou a Libras como primeira língua de uma criança surda. O único erro seria ser negligente com a escolha feita e esperar que o filho se adapte sozinho ao mundo! Crianças precisam de amor e de uma família que as ame acima de tudo, incluindo deficiências físicas ou sensoriais. Famílias como a sua…
Beijinhos sonoros,
Lak
Lindo depoimento, é tão bom ver que o esforço para ouvir vale a pena.
Cada caso é um caso mas sempre podemos nos identificar com histórias de gente com o mesmo problema e o mesmo desejo de ouvir.
Obrigada Lak por divulgar esse texto tão emocionante e real.
Abração Bárbara, abração Lak. 😉
Verdade, cada caso é um caso, mas a gente não tem como não se emocionar com alguns deles, tão belos…
Beijos
Muito belo, mais um verdadeiro exemplo! Emocionante! 🙂
Viu o post sobre a Ouvir, né?
Beijos
História bonita!! A união faz força e não só dinheiro mesmo e é importante ter carinho, amor e educação para família toda!!!
Beijos. 🙂
Até pra ser pai/mãe requer talento!! 😳
Beijos
Amei.Estou fazendo Treinamento auditivo, saio com cansaço mental, a fono fala mto sobre a questão do cérebro e , tampa a boca também.Me sinto uma criança de novo.hihi.Fico , cansada, mas vendo esse post, tenho que perseverar, e olha que ela foi desde de criança.
“A medida do amor é amar sem limites.” Tomás de Aquino.
Com ou sem dinheiro.Bjuss 😉
Criança tem mais disposição pra aprender. Adulto que fica de frescura hahaha
Beijos
Linda história! E nossa, tem algumas semelhanças com a minha, a dedicação de meus pais para que eu fosse oralizada, vivesse normalmente e independente. Inclusive ri comigo mesmo ao ler a parte em que Bárbara diz que os exames não batem com a forma que ela se comunica; eu continuo surpreendendo médicos, fonos, psico, inclusive uma psicóloga ao me conhecer, perguntou se eu tinha consciência do tamanho da minha “perda”… hehehehe… como você sabe… de severa a profunda… e me passo tranquilamente muitas vezes como ouvinte…
Ah, Lak! Acabei de enviar um depoimento para a Paula, mas quando eu receber o meu IC, com certeza compartilho a experiência aqui.
Bjos e obrigada pela força (e-mail) e parabéns a Bárbara e seus pais!
Vcs são exemplos de pessoas determinadas. Isso que impressiona tanto. E fico esperando o depoimento pós-IC aqui no DNO.
Até lá, vamos conversando via email.
Beijocas
Lak,
Cada vez que venho aqui (todo dia, rsrsrs) fico feliz e impressionada com a quantidade de pessoas que tu consegue ajudar!!
Beijo gigante!
hehehe como se vc não fosse igualzinha, né?
Beijãzão
Lindo o texto!
Mérito da Barbara hehehe
Abraços
É, mas na minha vida depois de tdo que passei não existe mais a palavra frescura. Tanto crianças como adultos devem lutar.As vezes temos apoio , às vezes não.Mas os sonhos não evenlhecem nunca.E que essa associação(como a Ouvir), seja um projeto a ser realizado, aqui no nosso país.Bjus
Pois é, as pessoas não deveriam deixar a frescura e a preguiça impedí-las de viver plenamente!
Beijos
Lak, mais uma vez, agradeço o espaço!
E obrigada pela palavras de todos que comentaram aqui, adorei ler!
Beijos!
Nós que agradecemos!! Beijos
Olá, se me permite gostaria de contar uma parte de minha história . Antes de ler seu blog, eu tinha um tambem, mas acabei deletando -o porque ninguem comentava nele haha! Mas acabei salvando os textos em uma parte. Bom minha historia é bem diferente da historia da Barbara (aliás, muito legal sua historia barbara ^^) . Comecei a ter uma leve perda no ouvido esquerdo com 12 anos, minha mãe reparou pois eu nao conseguia falar direito no telefone no ouvido esquerdo. Aí ela me levou na Otorrino e descobrimos que eu tinha uma perda auditiva leve-moderada no ouvido direito. Entao começou um acompanhamento e me foi ‘receitado’ aparelhos. Acontece que o acompanhamento feito de mes em mes as vezes eu chegava a estar escutando menos 5 decibeis a cada audiometria. Isso assustou minha mãe e a Otorrino muito, de modo que elas comemoravam quando a perda ‘ estabilizava’. A incessante busca para descobrir qual a razão da perda se estendeu durantemuito tempo,foram feitas audiometrias, desde tomografias ate exames de sangue no HC, até amostras que a filha dessa minha fono levou em congressos na Holanda, pois na época ela era estudante de medicina (hj trabalha com sua mae no consultorio) , com o passar do tempo eu ia perdendo mais e mais. Na época, aquilo tudo muito novo para mim, assustou-me um pouco. Minha mae me contou que eu me revoltei, não queria usar aparelhos auditivos e a fono contou a ela que eu ia de má vontade e nao gostava de ir lá. (eu sinceramente nao me lembro de nada disso ahahahahah mas tudo bem mamae falou tá falado!)
Daí, minha mãe nao sabia o que fazer pois ela havia comprado um aparelho pra mim e eu nao usava ele. Ela me levou até no psicologo mas nada adiantou na época. Cheguei a entrar em depressão. E assim eu segui na vida, com muita resistencia em relação a isso (não contava pra ninguem) e claro, cada vez perdendo mais. Hoje, tenho 21 anos, estou no ultimo ano de uma faculdade publica (essa é uma de minhas conquistas pois mesmo com todas as dificuldades p escutar os professores, consegui entrar em uma faculdade que muitas pessoas que nao escutam direito nao conseguiram \o/). Minhas perdas auditivas evoluiram para bilateral moderada-severa nos 2 ouvidos, uso aparelhos sim (me rendi a eles) mas hoje em dia eu sou super de boa em relação a isso. Acho que a gente vai aprendendo a conviver com isso. Pouco tempo pra cá comecei a contar para as pessoas e meus professores que eu possuo deficiencia auditiva , e a maioria entende perfeitamente. Não tive a sorte da Barbara, nesses anos a leitura labial se tornou parte importantissima da minha audição sem ela eu não escuto! Não consigo assistir tv aberta, globo só com o CC e tambem não me adaptei de jeito nenhum ao telefone. Musicas eu tbm so escuto com o fone de ouvido, mas eu tenho sorte pois tenho uma aficção muito forte com tocar instrumentos, toco um montão deles e muito bem. Teclado ou piano, tamborim, violão. Outro dia eu tva pensando comigo mesma, mesmo que algum dia eu va ficar surda eu vou sempre me lembrar da musica na memória. Então é isso essa é minha historia atraves dela tambem quero mostrar que mais importante que a nossa familia nos apoiar é nós mesmos nos aceitarmos. Fico pensando frequentemente nisso que a barbara pensa, dou graças a deus que nasci numa familia que sempre me apoiou e sempre teve condições de comprar bons aparelhos e pagar bons médicos, fico imaginando que muitas pessoas nao tem essa condição e tem que depender do serviço publico (que hoje em dia nos sabemos q no pais a situação do deficiente que depende da prefeitura pra ganhar aparelhos está complicada).
Espero q tenham gostado de meu depoimento, continue com seu blog Lak ele é muito inspirador apesar de ter um prisma diferente da minha perda( vc relata a vida sob o prisma do implante). Espero um dia poder fazer um IC tambem. Por enquanto estou feliz com meus aparelhos auditivos roxos (é um fashionismo sem tamanho anhahahah)
beijos
D.
Então… acho que nossas histórias são mais parecidas do que você imagina. Eu perdi a audição aos 10 anos, só fui fazer IC aos 32 anos, portanto, passei por essas mesmas etapas que você (inclusive a de implicar com os aparelhos!!).
Acho sensacional saber que você usa aparelho colorido. Eu tenho uma antipatia tão grande com o bege, nossa.
Você gostaria de escrever seu caso aqui pro DNO, assim como a Bárbara fez? Se quiser, é muito bem vinda!!
Parabéns por estar numa faculdade que é dificil entrar. Esse tipo de conquista mostra que não existe limite para quem se permite correr atrás do que quer!
Beijão enorme
Bom dia Lak!Tomei o cafézinho e agora vou opinar!
Lindooooo!!! O que amei demais foi tudo: a tua sensibilidade de fazer um post, a sensibilidade da Bárbara contar a história e a realidade mostrar que somos todos tão, tão lindos e próximos!Amei!
Teu comentário ao final é lindo, ele educa! Abraços 😯
Hehehe valeu!! Beijinhos… esse sapo tá com frio?
Olá Lak,
já tem alguns meses que leio seu blog com uma certa frequência. Gosto muito de ler depoimentos como o da Barbara. Fico tocado porque as experiências são similares à minha e a identificação é instantânea. Muitas informações que colho aqui e dos blogs que você indica são de grande valia, pois não sou lá ativista dos PNE’s (principalmente os aditivos) mas defendo o acesso à informação. Sou de Campo Grande/MS, formação em jornalismo e servidor público. Tenho perda bilateral de severa para profundo e com um diagnóstico tardio (aos 28 confirmei uma “dúvida” de uma vida toda!) e aos 28 comecei a usar as próteses. Sempre tive algumas “manias” que depois tiveram suas explicações. Quando algo me interessava sentava próximo ao professor, sem interesses lá no fundão. preferir legenda a filmes dublados, sem ter a consciência mas desenvolver a leitura labial e interpretar as expressões faciais para pegar o contexto e necessidade de sempre contar com colegas dispostos a explicar, novamente, tudo o que foi falado em reunião do qual não ouvia nada. Isso explica, mas tarde, porque tivera um comportamento agressivo, por sempre achar que estavam falando mal de mim (brigas em ambiente escolar nos primeiros anos de formação). Com o diagnóstico me ajudou a entender quem eu era de fato, deixando de lado o mito de dizerem que sou desligado, que só ouço o que quero… =)
O mais engraçado de tudo é como eu consegui ter êxito na faculdade de jornalismo, com disciplinas de telejornalismo e radiojornalismo, pois a perda afetou a minha dicção.
Não quero me estender, mas se for parar para contar a minha aventura até aqui, tomaria muito espaço.
Tenho blog com temática religiosa e sei como é complicado garimpar informações e redigir textos, por isso quero te incentivar, não desanime e continue firme e forte. Abraços
Obrigada, Rodrigo!
Fica o convite para você contar sua vida pra nós, se quiser.. Eu adoraria saber mais detalhes sobre como vc levou a faculdade adiante, mesmo tendo deficiência auditiva. Apesar de eu também ser formada e não ter encontrado grandes dificuldades para estudar, vejo que casos como o nosso são exceções. Por isso, o convite.
Beijocas
ameeeei a história da barbara! Me identifiquei com ela. Eeeeer, eu também coloco o fone de ouvido atrás do aparelho ligado na chave de telefone! HAHAHAHAH. eu acha que só eu que fazia isso! 😳
Eu não ouço música com fone no aparelho. No máximo, ligo apenas no IC… Mas prefiro ouvir pela caixa de som mesmo, que pra mim, fica mais fácil… hehehe
Beijocas
Lak, posso escrever minha historia sim, seria um prazer aliás. Estou pensando assim que acabarem minhas provas em re-ativar meu blog , assim poderemos ser parceiras blogueiras.
Se quiser, anota meu email. Beijos
D. Acho excelente vc reabilitar seu blog… Contar sobre a faculdade, etc… Dou mó força e ajudo na divulgação.
Te mando email sim, pra gente conversar sobre seu post. Vou adorar sua história aqui!!!
Beijos
É…, estou fazendo aulas de LIBRAS (finalmente criei coragem), estava fazendo uma pesquisa sobre a importância do interprete de LIBRAS para um trabalho que apresentarei amnhã na aula e acabei me deparando com o seu blog. Antes de qualquer coisa, quero parabenizar-te por se despir assim para gente e mostrar como é o seu lado.
Então, lendo o seu blog, decidi também me “despir”, não só aqui, para você e para os seus leitores, bem como também para meus colegas de turma, amanhã, na aula de LIBRAS. Todas as pessoas de lá são ouvintes, e eu pertenço a outro mundo.
Desde criança eu tenho muitas dores nos ouvidos, MUITA. Sempre fomos muito pobres e desenformados. Minha avó, por ser “do interior”, com a finalidade de me ajudar, fazia diversos remédios “naturais” e punha-os em meus ouvidos, com isso quando dei por mim, havia perdido significativamente a audição dos dois ouvidos.
Resumindo, hoje, tenho perda severa em um ouvido (direito) e média a severa no esquerdo. Só consigo ouvir no telefone se for com o ouvido esquerdo, isso se eu fechar o outro ouvido com o dedo e também fechar meus olhos pra não ter distração e me concentrar bastante. Continuo perdendo a audição…, não me adaptei ao aparelho auditivo, por diversos motivos, por vergonha, por achar que seria discriminado e também porque fiquei “doidinho” pois ouvindo, havia muita confusão com a leitura labial.
DETESTO quando eu não consigo entender algo e pergunto “desculpe, não ouvi”, e as pessoas dizem, “você é surdo?”.
SIM, SOU, ou melhor, quase.
A vergonha me fez adaptar às circunstâncias. Leio os lábios, perfeitamente, até se a pessoa estiver de lado, eu consigo ler pelo simples movimentar da bochecha. Assisto televisão sem o som, só com o CC ligado. ODEIO filme dublado, rsrsrsr. Eu engano bem, sabe? Pouca gente sabe, pouca gente disconfia que eu tenho perda auditiva. Me identifiquei com a Barbara, no sentido de quando vou ao Otorrino, ou fazer algum exame, ter de provar que realmente tenho perda auditiva.
Na verdade, na verdade, eu ouço os sons de médio a alto, porém não entendo. Preciso complementar com a leitura labial.
Meu médico disse, já há um tempo que, talvez um dia eu viva no silêncio.
Lembro-me que eu adorava música, porém, hoje já não curto mais. Não me atrai, não me agrada. Porém, quando eu leio a letra de uma música, e passo a gostar, “decoro” a letra e ouço o som, colocando as palavras na ordem correta, só assim passo a ouví-la. Está na moda remixar as músicas, assim, mesmo uma música que eu esteja “careca” de “ouvir”, estando remixada, onde as palavras não acompanham o som, me deixa doido, não consigo acompanhar, me perco e deixo de lado, perco o interesse.
Para mim, é a “morte” quando as pessoa falam tapando a boca, rsrsrs, não entendo, nada. Também não gosto de quem tem sotaque, rsrsr, eles deformam a boca, as palavras ficam erradas, tenho de passar meses aprendendo como eles falam pra poder adaptar.
Outra coisa, aprendi a ler “rápido”, as pessaos devem falar normalmente e não devagar. Falando devagar, eles deformam a boca e novamente, eu deixo de entender.
Meu médico me disse também que eu deveria aprender o máximo que posso antes de ficar “surdo de vez”. Então, estou terminado minha faculdade de direito, formo esse ano.
Seu blog me deu corragem de assumir minha surdez, apesar de que acho que poucos irão acreditar, estou tão adaptado. Você deve se perguntar, então por que dizer a todos? Não é por mero capricho. Quero um dia poder ser aceito e não me apartar das pessoas, vivi muito tempo no meu mundo por não aguentar mais ter que fazer “cara de paisagem” quando não entendo algo e ter de fingir que sim. Ficar balançando a cabeça e sorrindo.
Não quero que as pessoas tenham pena de mim, pois isso não é penoso, acho super divertido ser um “hibrido”, desfrutar dos dois mundos. Posso, por exemplo saber o que os jogadores e os arbitros do futebol estão dizendo…, posso “escutar” a conversa das pessoas, mesmo elas estando bem longe de mim, (parei de fazer isso, é invasão de privacidade), já me diverti muito, posso dizer que nesse aspecto, por ler os lábios, “ouço” até melhor que muito ouvinte por ai.
Quero poder ensiná-los de que infelizmente não sou igual a eles, comum. Sou diferente sim, mas minhas diferenças não devem nos apartar, devem nos fazer unir. Quero ajudá-los a lidarem com pessoa como eu.
Porque as pessoas podem até não gostar de mim (não faço nem mesmo questão disto) porém, respeito, eu exijo!
Espero não ter te chateado, nem mesmo a seus leitores…, precisava mesmo era desabafar, rsrsrrs. É estranho poder falar, poder escrever e raramente poder ouvir.
Sem mais delongas, despeço-me, espero poder encontrá-los mais vezes por aqui. Quero ter em vocês, amigos. Tchau. 😳 😳 😳 😳 😳
Olá, Allexandre. Legal que você está estudando Líbras. Está gostando? Verdade que interpretes de Libras são importantes para quem precisa dela.
Obrigada por compartilhar sua história conosco. É importante perceber que as histórias são diferentes, mas sempre existe alguns pontos semelhantes, porque a deficiência é mesma: ausencia parcial ou total de audição. Mas somos diferentes também, porque existem vários graus de perda auditiva, que ocorre em várias etapas da vida e que existe várias maneiras de se lidar com ela. Se você gosta da Libras, ótimo, é sempre legal ver surdos bilingues ajudando outros surdos, inclusive explicando sobre esse mundo para ouvintes.
Particularmente, eu não tenho afinidade com a Líbras, mas respeito. Prefiro o Implante Coclear, a leitura labial, as legendagens na TV e ter o português como único idioma (além do francês e espanhol, minhas paixões). Mas é uma escolha como a sua, que deve ser respeitada.
Adorei ler seu longo relato, ler sobre suas dificuldades, suas conquistas e suas realizações e opiniões.
Apareça quando quiser.
Grande abraço,
Lak