Exercitando o poder de escolha

Assim, fugindo um pouco da premissa do blog – de vez em quando, eu fico sem assunto – outro dia, eu assisti uma entrevista com o ator Michael J. Fox, aquele eterno molequinho da triologia cinematográfica “De Volta Para o Futuro”.

Como muita gente sabe, ele deixou um pouco a carreira de ator de cinema de lado para dedicar-se à pesquisa contra o Mal de Parkinson, doença que ele tem.  Em dado momento da entrevista, o entrevistador perguntou a ele se tinha aceitado bem a condição dele, já que essa doença ainda não tem cura.

Ele respondeu que existe diferença entre aceitação e resignação. Que ele aceitava sim o fato que tinha Mal de Parkinson. Mas, que não estava resignado achando que tinha que ter isso para sempre.

Fiquei pensando nessa frase um tempão. Porque perder a audição certamente não é escolha de ninguém. Por mais que algumas pessoas falem “tem horas que eu gostaria de ser surdo” ela refere-se que gostaria de não precisar ouvir dadas coisas (algum estilo musical detestado ou o barulho da obra incessante do vizinho) mas duvido MUITO que alguém gostaria de perder a audição de bom grado.  Pois isso significa também ser privado de um monte de outras coisas fundamentais e ser enviado a uma reclusão de silêncio involuntário que simplesmente nos desconecta do mundo ao redor, porque é pela audição que fazemos uma ligação coletiva uns com os outros.

E, infelizmente, a surdez ainda não tem uma cura definitiva. Ela pode ser tratada, mas continua sendo um mal permanente. O implante coclear é um recurso de reconexão com o universo sonoro, assim como os AASIs, mas são artificiais e, sem eles, sem pilha, a condição de surdez permanece como estado biológico.

Eu acredito que, a longo prazo, a terapia de células tronco possa vir a ser uma CURA definitiva para a surdez, sem o custo adicional, sem o aparelho pesando na orelha, sem a necessidade de trocar pilha (caso do aparelho totalmente implantado, o Esteem, que está em fase experimental ainda)…

Mas, ainda assim, todos esses recursos que já existem para diblar a deficiência auditiva são bem vindos. Podem e devem ser usados sem vergonha nenhuma, porque o importante é não perder nem um segundo em privação sonora. Eu perdi muito tempo sem ouvir e só lamento.  Ninguém ganha nada sendo surdo, mas perde-se muito não usando os recursos tecnológicos disponíveis.

Então, percebo que aceitação é possível sim. Aceitar a condição de que você tem uma limitação, de que seu corpo não se permite ouvir sozinho. Aceitar que você precisa usar um aparelho externo, semi-interno ou totalmente interno e fazer isso sem culpa ou vergonha. E sentir-se bem ouvindo ainda que de maneira artificial – sendo que no mundo de hoje, somos cada vez menos ligados à natureza e mais ligados à tecnologias.

E que resignação significa fechar os olhos pra tecnologia e pensar “ah, se eu não posso ouvir como antigamente/naturalmente/igual aos outros então é melhor não ouvir nada” e ficar esperando que o mundo mude  e pare de dar importância aos sons cotidianos, aos sons ambientes, aos sons naturais, às músicas e à comunicação sonora.  Sinceramente, fazer essa escolha é um direito de cada um, mas ao meu ver, é nada mais que resignação. E quem perde é a pessoa que faz essa escolha, porque enquanto ela faz isso, a vida simplesmente continua e os sons continuam encantando o mundo.

Beijinhos sonoros,

Lak

16 Resultados

  1. Paula Pfeifer disse:

    Lak,
    Por muito tempo fui uma dessas teimosas que achava que se não podia ouvir como antes, não valia a pena ouvir.
    Hoje me arrependo de cada segundo de burrice que vivi… Não me importa se o som não seja o mesmo.
    Se tenho um arrependimento na vida é ter ficado tanto tempo resignada!

    Beijo giga pra ti! Amo teus posts!

    • Avatar photo laklobato disse:

      Paula, eu também. Por isso eu acho que a resignação não nos leva a lugar nenhum, enquanto nos rouba momentos preciosos da vida. Ouvir é uma dádiva! Mesmo através de aparelhos!
      Beijinhos

  2. Armando disse:

    Lakshmi, encontrei no seu texto uma explicação sobre tecnologia para o ser humano e a que deseja dirigir o mesmo, uma pró e outra que envolve e manipula as pessoas pelo lucro. Desafiar os próprios medos e se utilizar dos recursos tecnológicos para aumentar sua relação com o mundo, é corajoso e pouco comodo, mas vale o destemor!

    • Avatar photo laklobato disse:

      Tudo o que o ser humano faz, pai, visa o lucro. Por que as tecnologias e trabalhos de reablitação deveriam ser de graça? Requer esforço, dedicação, pesquisa, talento, como todo o resto. De graça, nem a água que bebemos, entonces…
      Beijinhos

  3. Rogério disse:

    Em momento algum você fugiu à proposta do blog, pelo contrário. Eu conhecia muito pouco da história do ator, somente o fato de ele ter sido acometido pela doença. Não sabia que ele tinha se dedicado a estudá-la. Aí entra o ponto em comum: a diferença entre aceitação e resignação. Você sabe que venho de uma verdadeira guerra contra o vírus da hepatite C e, principalmente, contra os efeitos colaterais do tratamento. Não queira saber o que é sentir dores 24 horas durante meses. A infecção, o tratamento e respectivas consequencias aceitei, mas com resignação zero, que se traduzia pelo otimismo, irreverência e disciplina. Acho que delimitar bem a diferença entre essas posturas foi o ponto-chave para a cura. Beijão, belo texto.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Sabe o mais engraçado, Rogerio, é que a sociedade fala com desdém dos resignados, mas ao mesmo tempo, empurra quem tem uma doença/deficiência/diferença à resignação, em tom de “conforme-se e não encha o saco, já estamos fazendo a gentileza de te deixar respirar”.
      O seu caso é um exemplo claro de aceitação sem se resignar. Admiro muitissimo você por isso!! Conheço gente que não suporta a condição que tem – invariavelmente não escolhida, ninguém escolhe uma fraqueza – e entra em negação, em depressão, em resignação. E isso é triste, porque a vida da pessoa não para por isso, ela continua, a pessoa é que não… Beijinhos

  4. Patricia Kadel disse:

    Lak, como eu gostaria de fazer um vizinho meu entender desta forma, ele ficou surdo pequeno com 8 anos, por causa de uma doença infantil(não sei qual ao certo), agora tem uns 28, ele fala muito bem, mas não ouve nada, vou dar o endereço do teu blog para ele, pra ver se ele muda de idéia, pode até ser, já que vai ser papai logo, logo…….bjão 😀

  5. Judy disse:

    Lak, esse conceito de aceitação eu conhecia com o nome de resignação. Resignação no sentido de não ficar revoltado diante dos reveses da vida, e não de parar de lutar – muito pelo contrário!!!! É sair da revolta incapacitante e usar essa energia para crescer, lutar, buscar alternativas…

    Aprendi isso na doutrina que procuro seguir (espiritismo) e não entendia porque algumas pessoas achavam que se prega que a pessoa abaixe a cabeça e fique nessa inércia. Acho que o problema foi mesmo o termo, então!

    adorei o post!! 😉

  6. Lu disse:

    Querida,
    Você é linda!
    Entendo um pouco dessas coisas. Muito pouco. A vida me espera e me cobra atitudes. Vamos vivendo, porque o serviço do espírito é grande.
    E o seu trabalho é muito legal.
    Beijos. Saudades.

  7. Greize disse:

    Oi Lak, acho que vi essa entrevista…Será a mesma? Ele pede licença p/ sair e tomar remédio e conta um história interessante sobre um sábio.Que pede algumas pessoas para jogarem tdos os problemas num poço , e depois pede p/ pegar de volta, por fim todos pegam os seus próprios problemas.Moral:Cada um da conta do seu.Acho ótimo ele da altos incentivos em pesquisas para a doença.Aqui no Brasil deveria dar altos incentivos também em pesquisas na tecnologias, pois tudo é importado, e as AAsis, tem um custo mto alto por isso.
    Sobre Resignação, engraçado qdo estamos no hospital, sabemos que estamos doente, mas lutamos mto, para sair de lá vem um força maior, para não resignar aquilo tdo.
    Ah!o ator Michael J. Fox continua com o jeitinho “garotinho” não?rs
    bjuss 😉

    • Avatar photo laklobato disse:

      Não, não foi essa entrevista não. Mas, de qualquer maneira, é maravilhosa igualmente… Legal a história do sábio!!
      Concordo que deveria ter mais incentivo às pesquisas no Brasil, mas aqui, a gente consegue AASI pelo SUS tb!!
      Beijinhos

  8. Lu disse:

    É verdade!
    Foi preciso coragem, porque parece que você já falou tudo.
    E da melhor maneira. E quando escrevo, apago um monte de vezes.
    E quando mando, acho tudo muito ruim.
    Muitos bjs.

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