Gritos e sussurros

activeQue amanhã é o grande dia, todo mundo está cansado de esperar saber, mas antes da ativação chegar, a vida, pra variar, me pregou mais uma peça…

Segunda feira, eu entrei despretenciosamente no blog do Jairo Marques (Assim Como Você). Eu confesso que ando meio desanimada de acompanhar blogs. Não porque eu tenha deixado de amar as pessoas queridas, mas porque eu ando sem disposição e ânimo para qualquer coisa, mas qualquer coisa mesmo. Minha vida se tornou um mar de possibilidades, esperanças e incertezas. E eu sempre fui a pior das pessoas para lidar com qualquer coisa que fuja ao meu controle.

A maioria das pessoas que conheço adora  novidades. Eu detesto, adoro rotina. Gosto de coisas familiares, conhecidas, que eu sinto que estão sob o meu controle. Novidade, coisas desconhecidas me desconcertam, porque eu não sei se consigo (embora sempre consiga) lidar com elas.

E não poderia ser diferente com o implante. Vai dar certo? Super certo? Mega certo? Certissimo? Será perfeito? Levará 1 ano? 2 anos? 10 anos? Coisas que antes eram impossíveis, inalcancáveis, de repente, parecem estar QUASE ao meu alcance. E no meio disso tudo, meu coração grita e sussura, chora e dá risada, porque são emoções demais para que se permitiu adormecer para não sofrer.

A peça que a vida me pregou, vou entrar no blog do Jairinho e me deparar com a cena da novela “Viver a Vida” – eu não vejo novela, não tenho paciência com a vida alheia, já me basta a minha – em que a personagem da Alinne Moraes, Luciana, descobre que está tetraplégica. Quem viu, não precisa rever. Mas quem não viu, segue o video:

Essa cena é apenas uma cena de novela, embora também seja a realidade de muita gente que sofreu um acidente ou tenha ficado doente. E é dolorosa, triste e eu mesma demorei para conseguir assistí-la até o final…

Não porque eu seja covarde ou me emocione demais com novela, mas porque ela lembra uma cena específica da minha vida.

Quando eu fiquei surda, eu acordei surda, isso todo mundo já sabe, porque eu já contei. Mas o que talvez muita gente não saiba é que o meu caso não foi fácil de diagnosticar. A maioria dos médicos não sabia o que dizer, porque não era um caso comum. E eles ficavam perdidos quanto ao diagnostico. Poderia ser temporário ou não. Poderia ser psicológico ou não. Poderia… poderia… milhões de possibilidades. Até aquele dia.

Meus pais me levaram num otorrino e ele mesmo não soube dar um diagnostico preciso de porquê eu tinha ficado surda como fiquei. Mas, ele disse que surdez neurossensorial não era reversível e que o meu quadro era permanente e simplesmente não existia esperanças de eu ouvir normalmente outra vez. Até aí, era o trabalho dele como médico. Mas ele esqueceu de um pequeno detalhe: eu tinha 10 anos. E eu sabia ler os lábios muito bem. E ele falou isso na minha frente.

Eu nunca me esqueci desse dia. Nunca esqueci de arrancarem a esperanças das minhas mãos e me dizerem: Agora é com você, continue vivendo.

Mas ao contrário da Luciana, eu segurei o grito, porque eu era criança demais pra entender que eu poderia gritar e berrar: NÃO, EU NÃO QUERO!

Naquele instante, eu amadureci antes da hora simplesmente acatando o que foi dito, entre lágrimas e a espera que o tempo curassse as feridas, mesmo sabendo que as cicatrizes seriam eternas.

E hoje, mais de 8300 dias depois, em vez de amarguras e tristezas, de portas fechadas e incertezas, a vida me presenteia com esperança. A mesma que me roubaram quando eu tinha 10 anos…

Enquanto as palavras me faltam, porque a emoção é grande demais, um trecho de Mark Levy (sei lá se já coloquei isso aqui no blog, mas realmente AMO esse trecho  de “E se fosse verdade?”. É ele também o autor da frase: “O tempo cura todas as feridas, embora não nos poupe as cicatrizes”)

“Nada é impossível, só os limites de nossas mentes definem certas coisas como inconcebíveis. Muitas vezes é preciso resolver muitas equações para admitir um novo raciocínio. É uma questão de tempo e limites do nosso cérebro. Transplantar um coração, fazer voar um avião de trezentos e cinquenta toneladas, andar na Lua deve ter dado muito trabalho, mas precisou, sobre tudo, de imaginação. Então, quando nossos sábios, tão sábios, declaram ser impossível transplantar um cérebro, viajar à velocidade da luz, clonar um ser humano, digo a mim mesmo que, afinal, não aprenderam nada sobre os próprios limites, deve-se pensar que tudo é possível e que é uma questão de tempo, o tempo de compreender como é possível.”

Beijinhos,

Lak

32 Resultados

  1. Alex Martins disse:

    Lak, eu considero seu caso como uma sequência de pequenas batalhas e vitórias.
    A primeira aprender a viver surda depois de nascer ouvinte, a segunda o preconceito que vc tira de letra, outra luta é ter a certeza do momento emocional certo pra fazer a cirurgia. O resultado será só outra batalha e essa já está ganha. Se vc voltar a ouvir ganha mais um sentido se infelizmente algo der errado, vc sabe que consegue viver muito bem como vive hoje.

    Deixa o tempo passar e procura esvaziar a mente disso.

    Abraços
    Alex

  2. Zuleid Mattar disse:

    Lak,
    O título do post de hoje já é a sua resposta: Gritos e Sussuros.
    Você diz aí no texto que naquele dia não sabia que podia gritar … e só sussurou, e aquele grito engasgado em sua garganta está esperando há mais de 8300dias para eclodir!
    Grite muito agora! Como falou Alex aí em cima, se der certo grite de alegria, se não der certo grite de raiva e mostre a força que você tem prá superar “no grito” as lambadas que a vida lhe deu!
    Mas sabe de uma coisa? Tenho certeza que seu grito será de alegria porque você já fala e ouve como poucos!
    É só uma questão de “afinar”os ouvidos na sintonia correta!

    Beijos e até amanhã!

  3. fabiana disse:

    😉 Lak é emocionante este post. Eu que frequento este seu espaço há algum tempo, sei que vc é uma grande mulher. Fiquei sem palavras, e só posso te desejar muita força e que suas esperanças não diminuam. Você sabe seus limites 😛 😐 Bjss

  4. Renata disse:

    Lindo post, Latika. Força!! Amo vc :*

  5. renata disse:

    Oi Lak, vc como o jairo tem o dom de me tirar as palavras, e olha que eu sou para lá de tagarela. beijos e estou na torcida.

  6. Adriana disse:

    Gritando, sussurrando… ou escrevendo, você diz muito. E ensina, mais ainda. Beijo pra você, muita torcida, do lado de cá, pra que dê tudo certo e muitas energias boas pra te acompanhar, sempre.

  7. Bruna disse:

    Linda citação Lak. Assim como você, gosto mais de rotina que novidade, deve ser porque a vida me deu muitas novidades difíceis de lidar.
    Estou aqui torcendo pra que dê tudo certo amanhã.
    Bjaum!
    😉

    • Avatar photo laklobato disse:

      Acho que sim… Quando as novidades nem sempre são boas, a gente passa a ter uma certa aversão a elas!! Mas enfim, não podemos nos deixar enfraquecer por essa aversão, né?
      Beijinhos e obrigada.

  8. Kali disse:

    Eu continuo chorando com esses seus posts!!!! Enquanto vc “engoliu” o seu choro, o seu grito, eu choro… muito!!!! 😉
    Sei que a esperança às vezes pode ser avassaladora, mas quando conseguimos suportar esse mundo de inçerteza, insegurança e (não tem jeito a palavra é essa) pavor, muitas vezes acabamos tendo boas experiências!
    Você é muito importante na minha vida e as coisas que te afetam acabam me afetando fortemente também… por isso, continuo chorando: de tristeza, emoção, alegria, ansiedade e de rir!!!! 😀
    Te amo muito!!!

  9. SôRamires disse:

    Lak, a notícia que você captou aos 10 anos de idade me foi dada por um médico otorrino que talvez tenha cochilado em algumas aulas e me disse coisas assim: sua surdez é progressiva, não tem remédio, não tem tratamento, não tem solução.
    Eu por escolha pessoa era sozinha, tinha deixado a casa dos pais para ser um pouco livre de uma mãe muitíssimo autoritária (coitada não sabia ser de outro jeito) e lembro que digeri a má notícia sozinha numa caminhada regada a lágrimas silenciosas. Acho que nesse dia amadureci de uma vez por todas. Sem colinho, sem mão na cabeça, eu e minha perplexidade.
    Por sorte não estava totalmente surda e no BB éramos uma grande família, os mais velhos cuidavem dos mais novos com muito afeto e uma dessas colegas me indicou o otorrino de sua filha…esse otorrino parece que também tinha problemas auditivos me explicou que havia esperança, tratamento e aparelhos auditivos…Vivaaaa!
    Passei a tomar um medicamento na base de flúor, horrível, dava enjoos como os pós anestesia…tomei durante anos e não se se funcionou, se segurou o processo ou não. Mas com o Dr. Formigoni tive diagnóstico, tratamento e esperança. Foi o que me bastou para levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima!

    Amiga querida: AS MELHORES ESPERANÇAS PARA VOCÊ E SEU FUTURO BIÔNICO!!!

    Quanto à cena da novela que também não assisto não me emocionei e não entrei no clima porque o close revelava escandalosamente a maquiagem da personagem.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Sô, seria mentira eu dizer que entendo o que você sentiu com a noticia dada. Mesmo tendo um diagnostico similar, só sentindo na pele e tendo reação própria hehehe Mas sei que a dor é comparável a ter o coração rasgado com estilete.
      Ainda bem que existem médicos e médicos e nem todos acham que arrancar esperança das pessoas é a melhor tática! Que também se pode dar esperanças…
      No fim, a gente vai levando como dá! Obrigada pelos votos, viu?
      Quem sabe, uma hora, você se rende ao IC tb (soube que muita gente com otosclerose tb faz implante, mas tem que ser quando toda a audição já se foi….). Portanto, torcendo por você também, seja com for…
      Beijo
      p.s. a maquiagem tá uma coisa ridicula, concordo!

  10. Rogério disse:

    Estou preparando uma matéria exatamente sobre esse “medo” que os médicos têm de dar esperanças a seus pacientes, sob a alegação de que podem ser falsas esperanças. Isso acaba redundando na prática, que pode ser considerada recorrente, de decretar falsas sentenças. Mais de uma vez ouvi dos médicos que não adiantava buscar alternativas para minha filha, porque ela seria para sempre um vegetal. O tempo mostrou que eles não sabiam de nada. Belo post, enriquecido com muito brilho pelo depoimento da Sô. A adrenalina vai bem, né? Torcendo por você.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Médio, ja tô meio preparada pra NAO ser amanha a ativação, dada a falta de organização da equipe… Meu humor não ta dos melhores hoje…
      Mas, quero muito ler a materia sobre medo.
      Beijinhos

  11. Rogério disse:

    Tava me esquecendo: mesmo sem muita paciência para os blogs, você esteve lá na Alessia recentemente?

  12. Juca Jardim disse:

    oi Lak!

    Acho que vc tá almoçando, né? (eu tb vou encher o panduio agora, depois volto)…

    Bom… acho que agora é esperar cair a ficha, né… imagino – talvez os outros implantados do blog possam dizer melhor – que a réplica desses 8.300 dias possa ser dada em seguida… começando a escutar vai acabar concretizando o quanto realmente tinha perdido… por isso é ótimo saber que tem tantas pessoas assim ao seu lado e que vc é muito querida mesmo!…

    Mas na verdade queria mesmo aproveitar o espaço do blog pra registrar o que pra mim é um exemplo praticamente insuperável de superação e que fiquei sabendo ontem lendo uma matéria da Época… a história de Odele e de sua filha Flávia… não que seja uma situação inédita mas é mesmo uma dessas que tocam no fundo do coração:

    http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI105927-15228-1,00-SAUDADES+DE+SUA+VOZ.html

    beijos! (volto despois 🙂 )

  13. Simone disse:

    Lak, o seu post me deu uma impressão de que no meio de tudo, soltou uma de filosófica! 😮
    Os seus medos, os seus gritos, os seus sussurros, isso é NORMAL, demais, Lak! Até fez questão de criar expectativas?! 😮
    Lak, sabe o que eu pensei? “Lak, quero falar uma coisa séria: seja você mesma!” E fica tranquila…fui…! 😀
    Não liga para isso, Lak, é o que pensei em relação a você.
    Milhões de beijos!
    Simone.
    P.S.: estou na torcida. (sua ativação) 🙂

  14. Jairo Marques disse:

    Bergaman usado de uma forma espetacular, heim?! Tenho adoração por sua sinceridade cortante… é meio escorpiano isso ahahhaha… Livre-se das expectativas dos outros, gata…. desligue de tudo, se for o caso, e ligue-se apenas em vc… o resto vc dá um jeito, depois…. beijos

  15. Ricardo (bardo) disse:

    Lak, você é um exemplo de superação. Você já venceu, mesmo antes de surgir a possibilidade de escutar novamente. É uma mulher fantástica, inteligente, culta, de personalidade e caráter. Você já foi muito além do que as pessoas normalmente vão.
    A ansiedade diante de um momento tão importante é algo que a todos ataca, imagino numa situação como a sua.
    Mas acredite, independentemente do que aconteça (e tudo vai correr da melhor forma possível, tenho certeza), você já venceu.
    Com todo o carinho do mundo.

    Ricardo (bardo)

  16. Olivia disse:

    Hola Lak, o teu relato me emocionou muitíssimo mesmo. Vc é uma mulher muito sensível e brilhante. Eu digo com toda a certeza do mundo: vc vai ouvir muito bem com o implante!. A sua mente vai lhe ajudar pq vc é muito inteligente. Não esqueça de ter uma atitude positiva (vc tém) para esta nova vida que se te apresenta. Desta vez não deixará de ouvir, desta vez começará a ouvir de novo. Te mando un beso graaaaaaaaaaaaandote.

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