Memória audiovisual

Hoje de manhã, me deparei com um email do Rogério, autor do Blog do Negão.  Isso porque ele, ao ler sobre sinestesia aqui no blog, ficou me devendo um relato sobre o tema.

Quando li o email dele, me dei conta de que não era exatamente sinestesia, mas de sons inspirarem o sentidos, as lembranças, as emoções…. O relato em si, é lindo:

Minha professora de violino me convidou para assistir a uma palestra proferida por um cara genial e completamente doido chamado Helmut Seilaoquê, austríaco radicado nos Estados Unidos.
O cara é formado em filosofia, psicologia, música, musicoterapia, direito e mais uns três ou quatro cursos e tinha na época cerca de 45 anos de idade.
Tema da palestra, que achei mais doido que o palestrante: “As mensagens contidas em sons não articulados”. Fiquei petrificado ao longo de mais de uma hora e meia de palestra, fascinado com as coisas que o cara falava e a toda hora eu pensava comigo “porra, é mesmo, como nunca vi a coisa por esse ângulo?”
O Grand Finale foi de arrasar: de repente o cara pede para a platéia (99% composta por professores ou estudantes de música) ouvir um som que ele tinha gravado num CD, e pediu, a quem quisesse, que escrevesse o que ou que sentimento aquele som trazia ou provocava.
Eu fiquei na minha, porque o som era somente um silvo, um assobio bem ao longe, que perdia nitidez por conta de outro som mais grave que se sobrepunha e lembrava o som do vento batendo em um microfone. Sei que você não ouve, mas tente imaginar ou mentalizar isso. Para mim aquilo era simplesmente um barulho, não consegui identificar ou sentir nada a respeito e para não escrever besteira não escrevi nada. Mas teve quem se atrevesse e 32 pessoas devolveram preenchidos os pedaços de papel que foram distribuídos. Com a ajuda de um tradutor ele separou alguns e leu em voz alta o seu contendo: MÃE(2 vezes), MEDO, FRIO, DOR.
O que me deixou de queixo caído foi a revelação do que era aquele barulho: tratava-se de uma gravação subaquática feita pelo naturalista e oceanógrafo Jacques Cousteau em um ponto próximo do pólo norte, dos sons emitidos por um filhote de baleia branca durante o período em que ficou preso entre blocos de gelo, até o momento em que sua mãe conseguiu libertá-lo, ferido mas com vida. Teve duas pessoas que escreveram a palavra MÃE! Sem desmerecer as que escreveram medo, frio e dor, teve gente que identificou na linguagem de uma baleia o chamado da mãe. Mesmo no mundo das baleias, mãe é mãe.

Esperando o retrato de vocês, do lado de cá!

Esperando o retrato de vocês, do lado de cá!

Há muito, muito tempo, os sons não são pra mim mais do que ruídos, portanto, embora eu consiga identificar o que muitos deles se tratam (especialmente padrões, como toque de telefone, buzina, latido de cachorro) não posso dizer que eles me causam grandes emoções.
Não que isso seja triste pra mim (embora saiba que tem quem ache isso terrível, mas eu não sofro), o texto do Rogério despertou uma enorme curiosidade ao respeito dos sons, coisa que eu não sentia há muito tempo.
Então, fica o post final da semana, com um pedido: Na quarta-feira, eu transportei cada um de vocês pro meu mundinho de sussurros incompreensíveis e silêncio que fala. Agora, eu quem peço, você seria capaz de descrever um som, uma música, um ruído, que aflora em você alguma lembrança especial, uma emoção específica e por quê, para fazer uma pobre surdinha (vai, eu posso apelar) ser capaz de ouvir o mundo através dos seus olhos?

Grande beijo

Lak

p.s. Nota do meu amigo K. no MSN: “Pobre surdinha com quem eu já discuti MÚSICA”. Tinha que vir pro blog, claro!! haha

28 Resultados

  1. Juca Jardim disse:

    putz… memória olfativa é mais frequente, né… olfato é o sentido mais primitivo, acaba registrando mais… agora som 😐 … não sei se é isso que vc esperava mas eu chego mais perto do seguinte: MORRO de medo de eletricidade! (no máximo, troco interruptor, tomada e resistência de chuveiro!)… daí que o seguinte… lugares onde tem alta tensão às vezes emitem um som padrão tb, muito característico, Lak… alguma coisa como um “MMMMMMMMMMM” constante… (lembro que eu empinava pipa perto de uma fiação daquelas “grossas” que tb fazia um som desses… um dia meu amigo teve a bela idéia de ficar atravessando um galho ainda verde pelo alto dessa fiação de um lado pro outro até a hora que – dã – o galhou parou atravessado nos fios e foi uma explosão só!… cabô com a energia do bairro todo! 😀 )… resumindo: SEMPRE que eu percebo um som de “MMMMMMM” por perto eu fico involuntariamente atento até ver de onde vem e ficar tranquilo! 😛 … acho que não posso agora lembrar de mais outra coisa… se depois eu conseguir, aí eu escrevo de novo, ok? 😉
    mais beijos!!!
    (ah… no caso aí da coincidência do som com “mãe” que teu amigo Rogério te relatou… vc sabe que eu sou meio cético, né, então eu acho que tentava explicar como um registro arcaico de uma transmissão do som em meio líquido… no caso, intra-uterino, né…)

    • Avatar photo laklobato disse:

      Hahahahaha curti… curti…
      Uma coisa engraçada, sabe quando vc liga o chuveiro eletrico muito fraco e a força desliga sem querer (ele fica gelado)? Eu consigo perceber isso, pela mudança rapida de luz (pelo menos no banheiro da casa da minha mãe, o meu chuveiro não desliga assim facil). O Edu falou que ele sabe que o chuveiro desligou pelo som – diz que lembra um pastel fritando – mas nem tinha reparado que a luz se alterava…
      Impressionante como a gente usa o recurso mais acessivel, né!?
      Sobre o causo do Rogério, eu tb fui meio cética… huahaua Mas achei legal o relato!

  2. Patie disse:

    Bom… quando eu era pequena (menor do que eu sou hoje, AHAH) eu estudava numa escola que eu adorava. Mas claro, naquela época eu não tinha responsabilidades e muito menos uma pilha de tarefa de casa pra fazer, então quase todos os dias eu pedia pro meu pai – que era quem me buscava na escola – dar uma passada num playground que tinha no caminho. Eu adorava esse lugar, porque ele era super diferente, tinha um trepa-trepa MUITO grande, em proporções exageradas, que tinha algumas partes planas, então eu adorava ir lá brincar que era meu castelo. Mas meu brinquedo favorito era com certeza o balanço… eu adorava me balançar SUPER alto. E do lado desse playground, tinha um homem que vendia caldo de cana. A combinação caldo de cana + balanço nunca era muito saudável e eu sempre chamava o Hugo, se você me entende ahahaha
    Meu pai sempre ficava no carro me assistindo brincar, e ele não se importava muito com a minha demora porque ele aproveitava pra ficar ouvindo programas esportivos no rádio. Geralmente, quando eu entrava no carro estava super enjoada, por causa do balaço e do caldo de cana… então eu associei o barulho do rádio, o zumbido, os programas esportivos ao enjôo. Até hoje, quando eu escuto algum desses programas (e meu vizinho escuta quase sempre) a sensação de enjôo parece vir de novo. Ou quando eu escuto música sertaneja (que era o que a minha mãe ouvia quando era ela que me levava).

    Tb não sei se era bem isso que vc esperava, mas foi o que eu lembrei!

    Beijinhos

  3. Juca Jardim disse:

    ahahaha… isso, mas do jeito que vc escreveu parece que entendeu ao contrário! 😛 … qdo tá ligando é “pastel fritando”!!! 😀 … qdo desliga, aí fica só o som da água caindo no chão (falo por mim, pq debaixo no frio eu não fico!!! 😀 )

  4. Miriam disse:

    Bom…pra mim, uma música que traz lembranças boas é “Le Lac de Come”…quando eu a tocava ao piano, com a minha mãe ouvindo e me corrigindo (eu era estudante na ocasião).
    Como é Le Lac de Come?
    Como uma dança…imagine bailarinas vestidas de branco, deslizando suavemente sobre um tablado azul…ritmadamente…constantemente…suavemente…alegremente…romanticamente…td misturado…
    Mesmo na parte da tempestade (Le Lac de Come tem uma história), ainda vejo a suavidade dos passos da dança, ritmada, constante e terna…

  5. Miriam disse:

    Sim, porque me lembra essa felicidade das coisas pueris a que não damos o devido valor…

  6. Maíra disse:

    Só queria dizer que fiquei emocionada com o e-mail (era pra ficar?) no momento em que seu amigo fez o relato da palestra. Impressionante como o som traz tantos significados ne? E olhe que não era um som corriqueiro…
    Fiquei impresisonada.

  7. Maíra disse:

    …. não tenho algum som que tenha me marcado, ainda que com meu aparelhinho consiga identificar um bucado de sons …

    acho que não são importantes ou acaba não ficando na prioridade.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Num cheguei nesse estágio de evolução humana tb.
      Ademais, eu confundo tudo. Outro dia, tava no banheiro do shops. Ouvi um som agudissimo e estridente e pensei: “Meldels, tão estrangulando um gato no banheiro do shopping?”.
      Saí e era uma criança fazendo escândalo….

  8. Mariana disse:

    Não sei se alguma vez te falei, mas pratiquei ballet durante muitos anos ( dos 5 aos 14). Eu adorava, mas era duro, muito duro. Os pés sangravam, os músculos doiam, eu não tinha força pra nada, mas não queria desistir. O meu pai, que sempre morreu de medo da minha suposta fragilidade e sempre admirou a minha determinação, costuma então fazer uma coisa. Colocava música clássica, e dançava comigo. Mas ao colo. E ainda hoje, os meus pés levantam do chão quando ouço a dança das horas de Ponchielli .

    E isso pq não danço há mais de 20 anos…

    vou deixar link da música, Lakinha… talvez vc a consiga visualizar… ( é, só depois de copiado o link do “seu tubo” lembrei que vc não ouve… 😛 )

    • Avatar photo laklobato disse:

      Depois farei o impossivel pra tentar ouvir. Musica classica é a que eu chego mais perto huahuahau
      Muito grata pelo relato. Deu pra viajar na imagem de vc dançando no colo do seu pai. Lindo lindo….

  9. Fábio disse:

    Pode não ser algo poético ou bucólico, mas diria barulho de um veículo passando por um pequena poça na pista molhada como o que eu ouço agora a uma certa distância daqui da janela da minha sala de jantar. A pista é a rua principal daqui do bairro, acho gostoso tal barulho pois o associo a um noite fria e encoberta, características climáticas as quais me agradam. O contato do pneu por sobre a água, barulho de molhado mesmo, mesclado ao motor do veículo e o barulho advindo da velocidade ( q também não pode ser grande, em razão da própria segurança dos ocupantes do carro ).

  10. Rogério disse:

    Menina, gostei muito de fazer parte de seu blog de maneira mais destacada. Obrigado. O Juca mencionou uma coisa que não tinha me ocorrido: a questão intra-uterina. No e-mail me esqueci de dizer que aquele som mais grave, parecendo vento no microfone, era na realidade a corrente marítima, ou seja, a boa e velha água. Dá o que pensar. Um beijo.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Viu só? Você não esperava uma surpresa dessas, né?
      Mas o texto era lindo, mereceu vir pra cá.
      Pois é, o Juca é sabido das coisas huahuahuaa

  11. Lak, eu venho do blog do Jairo, e cheguei tarde.
    Prá variar, vou ter um caminhão de posts prá ler, seu texto é arrasador!!!
    Parabéns!
    Ah, um som inesquecível prá mim é o do estribilho da música Papel Marchê, do João Bosco, que eu cantava prá minha filha Bia, quando era bebê e ela morria de rir.
    É parecido com o movimento de uma onda no mar, vem devagarinho e depois cresce bem alto e se esparrama…
    Beijo grande,

    • Avatar photo laklobato disse:

      Eu não conhecia a música, fui procurar a letra e achei realmente fofa!!
      Fique à vontade pelo blog. Amigos do Jairo são meus amigos hihihi
      Beijinhos

  12. Sam disse:

    Lak, show esse texto. Quer saber o som que mais me emociona? Ouvir o coração de alguém batendo forte por você. E esse você sente mesmo, nem precisa escutar. Mas falando de música, gosto de rock progressivo, Dream Theater, Morcheeba, bandas em que o grave é forte, dá pra sentir mais o ritmo.
    Beijão!
    Sam

    • Avatar photo laklobato disse:

      Eu,Sam… Esse não vale porque transcende qualquer sentido.é extra-corpóreo! Mas, tiro o chapéu pela lembrança espetacular! Pensar nisso foi lindo! Super obrigada! Beijo

  13. Super disse:

    eu tenho uma ótima memoria fotografica e auditiva. O resto é normal. 😀

  14. pamela disse:

    😐 😡

  15. Judy disse:

    Lak, som de elevador me lembra que fiquei presa muitas vezes. Eu entro e tampo os ouvidos e escondo a cara no peito do marido, se não tiver ninguém por perto. Imagina o que os porteiros que olham as câmaras devem pensar. Tomo banho de porta aberta porque estar numa caixa ruidosa (box + chuveiro) me dá a mesma sensação.
    Meu marido diz que a Schindler devia me contratar. Eu conhecia cada ruidinho dos elevadores do prédio da minha mãe, sabia em que andar tava raspando e quando estava perto de quebrar. Eu disse que só topava a contratação se eles gravassem o ruído e me mandassem, porque entrar em elevador sem necessidade, nem morta.
    Eu me lembro que tinha medo – hoje tenho desconforto – de sons distorcidos, como fita cassete enroscada. Na primeira série, tinha que desenhar meus medos, e escrevi “mau som”. A professora marcou um “xis” de errado em cima, mas esse era um dos meus maiores medos.
    Já ouvir BeeGees, Beatles, Simon e Garfunkel… Lembra meu pai, que morreu quando eu tinha 9 anos. É uma lembrança gostosa.

Participe da conversa! Comente abaixo:

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.