O papel dos psicólogos no programa de Implante Coclear
Alguns programas de implante coclear – embora não todos – são formados por uma equipe multidisciplinar que inclui a participação de um profissional de psicologia.
Há 10 anos atrás, em 2007, quando eu entrei para o programa de Implante Coclear do Hospital das Clínicas de São Paulo, entrei como paciente do SUS (embora eu tenha trocado posteriormente para o atendimento via convênio e operei desta forma) tive que passar por algumas consultas com psicólogos. No meu caso, foram nada menos que 10 consultas. Eu sinceramente não sei se era o protocolo da época ou se viram algo estranho em mim e acharam melhor vasculhar minha cabeça. De fato, não erraram, sou um paciente bem diferente da maioria hihi.
Hoje em dia não sei são tantas consultas, mas ainda acho importante que as pessoas passem por psicólogos antes da cirurgia, como parte do processo de avaliação. E por que? Porque é necessário conversar com um profissional sobre as expectativas, tanto do paciente, quanto da família.
Falar sobre expectativas quanto ao implante coclear não é um assunto fácil. Obviamente, se a gente não tivesse aquela vontade de ouvir tudo, de falar no telefone de escutar música até o mundo acabar, de entender todas as pessoas em qualquer lugar, de estudar novos idiomas, ninguém se submeteria (ou um filho) a uma cirurgia. Encaramos uma anestesia geral, ser entubado, ter o crânio perfurado (é só um furinho mínimo) e lixado (para acoplar a parte subcutânea) para ouvir, isso é fato.
A questão é que os resultados variam. E assim como variam também as expectativas particulares e a forma individual de cada um lidar com os possíveis resultados.
Então, para que serve falar com um psicólogo?
Primeiramente, para que cada paciente (ou pais) entendam que nenhum resultado é garantido. Cada ser humano é único, mesmo um caso idêntico ao seu, poderia ter resultados diferentes, porque não é apenas colocar o eletrodos na cóclea que vai fazer total diferença, mas como o cérebro (córtex auditivo) de cada pessoa interpretará as informações sonoras que chegarão nele. Pode ser que o resultado permita que o paciente tenha total discriminação auditiva e entenda pessoas sem precisar de leitura labial. Mas também pode ser que ele continue dependendo da leitura labial. Pode ser que o usuário consiga falar no telefone, pode ser que não. Pode ser que ele consiga ouvir música – bem menos comum, já que os implantes costumam ser feitos para priorizar mais a fala do que música – pode ser que não consiga. Por milhares de motivos, que se resumem a um só: cada organismo é único, cada pessoa é única e cada caso é um caso.
Depois, não menos importante, a consulta é feita para que o paciente tenha oportunidade de desabafar com alguém, explicando sobre esses desejos e expectativas, sobre as mágoas que a surdez trouxe, sobre medos e angústias relacionados ao processo cirúrgico. E ninguém seria melhor que um profissional especializado para escutar e aconselhar da maneira mais imparcial possível.
Além disso, existe um fator que não pode ser descartado: lidar com essas expectativas depende da personalidade, do histórico de cada um. Pode ser que a pessoa tenha um resultado mediano e seja extremamente feliz de ouvir mais do que ouvia antes (como no meu caso, quando tinha apenas o primeiro IC) e pode ser que a pessoa tenha um resultado auditivo excelente (consiga discriminar excelentemente bem a fala) e não goste do implante coclear. Talvez porque o grau de comparação da pessoa seja a audição natural, talvez porque ela não goste de ter que usar um aparelho externo, etc.
Ou seja, há a questão de entender se o IC atenderá às expectativas individuais de cada pessoa ou família. Com o que ela compara o som que ouve através da tecnologia. Com o quanto a pessoa espera ouvir. Nem todo mundo, mesmo alguns que têm o melhor resultado esperado, gosta do implante. Há pessoas que não conseguem ficar satisfeitas, porque não é a cura que elas gostariam. Porque não é perfeito como acham que deveria ser. Porque tem a questão da estética, da manutenção, de perceber que continuam tendo deficiência auditiva mesmo implantados.
Por isso, é tão importante conversar com um psicólogo antes do implante: para alinhar expectativas com a realidade. Para trazer uma série de reflexões que podem impactar diretamente do ânimo pós-ativação de cada usuário. Aproveitem a consulta, abram o coração e sejam honestos consigo mesmos e com o psicólogo!
E depois do IC, devo continuar?
Aí é uma decisão do paciente. Particularmente, acho que se emocionalmente a pessoa estiver muito abalada com as mudanças que o IC estiver trazendo para a vida dela ou se ela não estiver conseguindo lidar com frustrações, terapia pode ser muito bem vinda!
Em última instância, conversar com implantados veteranos também ajuda bastante nessas questões. Precisando, é só chamar!
Beijinhos sonoros,
Lak Lobato
Excelente. 👏👏👏🎀🎀🎀💙💙💙
Pedido feito <3 Pedido atendido <3
Ameiiii 😍😍😍😍
muito bom.
E quando o psicólogo é implantado também heim? Ahhh que maravilha neh ❤(rsrs, é pq amo ser psicóloga). Muito bom o texto Lak, excelente! Acredito que o pré e pós operatório necessitam sim de um acompanhamento com psicólogo, mesmo que mínimo, e é bem isso tudo o que você falou. 👏
<3 seria muito melhor hahahaha <3
Eu acho que deveria 1. ser obrigatório passar por 5 consultas antes e 5 consultas depois
Isso. E como você disse, caso necessário depois a critério do paciente/família para possíveis terapias quanto a adaptação, etc.
Oi, Lak!! Tudo bem? Sou psicologa, deficiente auditiva e fiz um curso sobre o atendimento psicológico direcionado para equipes que trabalhem com Implante Coclear, oferecido pela equipe do HC. Primeiramente, em todos os procedimentos que envolvem cirurgias e que prometem grandes resultados, é necessário a avaliação do psicologo, esta avaliação dificilmente ocorre com menos de 5 encontros (é a média que utilizamos para triagem psicológica, dá pra fazer com 5 ou 10 encontros). No seu caso, você era candidata porque já tinha ouvido e tinha memoria do som, mesmo tendo ficado muitos anos sem ouvir, mas com certeza havia um risco de se criar uma grande expectativa sobre voltar a ouvir, e não ser atendida. Por isso quanto mais jovem for a pessoa que deseja fazer implante coclear, melhor são as chances de sucesso. Há toda uma questão de aprendizagem do som, que é desenvolvido na fonoterapia. Por isso a avaliação psicológica precisa ser cuidadosa. Acredito que a maioria das equipes que realizam implante tenham psicólogos para esta avaliação.
O que vc disse é verdade, os corpos são diferentes, reagimos de formas diferentes e criamos expectativas sobre as coisas. Continuar no atendimento psicológico depende de como as pessoas lidam com as situações de sua vida e isto cabe ao cliente e o profissional decidirem juntos. E claro que se o cliente quiser, mesmo que não tenha indicação do profissional ele pode, afinal a psicoterapia oferece uma possibilidade enorme de autoconhecimento.
Beijos e sucesso!!!
Oi, Raquel! Na verdade, foram 5 consultas, pq eu abandonei o programa e voltei. E tive que passar de novo pela triagem. Foi um caso bem dificil de aprovarem, não apenas pela questão do tempo de privação, como também pela questão da perda traumática. Ninguém sabia como alguém como eu iria reagir. Mas, eu acho que reagi melhor que a maioria haha de fato, foi algo que merecia ser avaliado. E eu acho que o acompanhamento deveria ser posterior a cirurgia tb! Beijiinhos
Eles comentaram seu caso e disseram que foi um risco muito grande. Que bom que deu certo!! Sim é importante fazer um acompanhamento, mas acho que não tem estado nas prioridades dos serviços de saúde. Uma pena.
Tenho certeza absoluta que hoje deve ser um dos maiores casos de orgulho de apostar altissimo que eles tem hahaha
Acho que o psicólogo deve ter a mente aberta e não se basear apenas em teoria. Tal fato, aparentemente, a maioria não teve eventos traumáticos em suas vidas e nem vivência sobre a surdez ou qualquer trauma que o paciente apresenta. Lamentável de estarmos em um mundo que poucos tem empatia pelo outro ser humano.
Não entendi seu comentário, me perdoa?