Estudar inglês na Inglaterra graças ao Implante Coclear

Já falei isso antes, mas não me importo de me repetir. Sou apaixonada pelo poema de Fernando Pessoa, chamado “Mar Português”. A poesia toda nem é tão conhecida, mas um verso dele é bem popular “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”. Ainda assim, eu gosto da estrofe seguinte, que é a minha inspiração para ir além dos meus medos sempre:

Quem quer passar além do Bojador
tem que passar além da dor
Pois Deus ao mar o perigo e o abismo deu
Mas nele é que espelhou o céu!

Você sabe o que é o Bojador? Nos tempos das caravelas, as pessoas achavam que o mundo era plano e que quando chegava no horizonte, havia uma queda e o mundo acabava. Essa linha que separava o mundo do fim do mundo se chamava Bojador.

Na linguagem poética, passar além do bojador significa ter coragem de enfrentar os próprios medos. Pois os marinheiros acreditavam que teriam morte certa se fossem além do bojador.

Eu perdi a audição ainda criança e, para quem tinha ouvido até então, filha de pais que não tinham qualquer conhecimento sobre deficiências, a minha vida inteira se tornou um bojador. E cada vez que eu ia além do que as pessoas diziam que eu poderia ir (leia-se: fazer faculdade, casar, trabalhar, ser feliz) era sempre como enfrentar um Bojador, já que sempre existia (e ainda existe) gente me dizendo que pessoa com deficiência não pode, não deve, não consegue…

Hoje, chegou o dia que eu cruzarei mais um bojador. Não sei se dessa vez o bojador é meu ou se é de tanto ouvir que deficientes auditivos tem dificuldade de aprender idiomas, mas…

Quando adolescente, muitos amigos iam para os Estados Unidos e para a Europa estudar inglês, em sistema de intercâmbio. Sempre quis fazer isso também. Mas, se tem um idioma com o qual sempre tive dificuldade de entender via leitura labial, era a língua inglesa. Resultado, aprendi francês e fiz intercâmbio de espanhol. Mas meu nível de inglês continua sendo aquém dos meus desejos.

Visto isso, depois de dois anos de implante, de discriminação auditiva muito boa, obrigada, criei coragem e estou indo logo ali em Londres realizar meu sonho de adolescência! Na mala, apenas a coragem, meus implantes cocleares e o Roger (o novo sistema de transmissão sonora da Phonak) caso eu sinta dificuldade em sala de aula. Curso intensivo de 100 horas em 1 mês.

Por um lado, sinto um prazer enorme de finalmente ter condição de realizar meu sonho (com apoio da FORL e do Dr. Ricardo Ferreira Bento, que intermediou para eu conseguir uma bolsa de estudos). Por outro, um pânico enorme de pensar que estou saindo da minha zona de conforto, porque o inglês não é um idioma que eu domino ou com o qual me sinto confiante.

Um amigo me perguntou de onde vem essa minha vontade de me desafiar sempre, de sempre querer ir além. Acho que é nata, já nasci com veia de desbravadora. E em tudo que a surdez me podou nesse sentido, o implante coclear me liberta dos medos, dos receios e me permite extravasar aquela coragem que já existe.

Não digo que todo implantado deva ser ousado. Mas só que ele pode tentar, se houver vontade.
Se vai dar certo ou não? Hummm, eu mantenho vocês informados!

E, se me permitem, vou ali fechar a minha mala, deixar os medos na gaveta do quarto e levar apenas o sonho de adolescência…

Beijinhos sonoros e até o próximo post em solo britânico.
Lak