Seja corajoso…

 

Como não tenho foto scaneada da apresentação do meu TCC, fica essa foto que representa muito bem o meu estado de espírito.

Como não tenho foto scaneada da apresentação do meu TCC, fica essa foto que representa muito bem o meu estado de espírito.

Estava no último ano da faculdade. E, como todo mundo sabe, último ano de faculdade é estressante. Trabalho de conclusão de curso pode ser um tremendo pesadelo, especialmente quando envolve apresentá-lo em público. 

Tá, sei que existe gente que fala em público de boa, mas essas, são a minoria. A esmagadora maioria de pessoas que conheço – especialmente aquelas que estão na faculdade – não curte tanto assim e a simples menção de que teríamos  que apresentar o trabalho num auditório cheio assustava qualquer um.

No meu caso, envolvia um medo a mais, porque sou encanada com minha voz. E, me dava medo a idéia de falar pra 300 pessoas que eu não conhecia. Portanto, quando era a minha vez, eu tinha a proposta de me usar da minha deficiência e pedir pra ser dispensada nessa parte. Afinal, tratava-se de um caso especial e não de mera má vontade.
 Mas, o destino nos prega umas peças pra mostrar que a vida vale mais a pena quando enfrenta-se os medos.

Durante uma reunião com professor, para orientação do trabalho, ele vira pra mim, do nada e diz:

– Lak, você já pediu dispensa na apresentação de auditório?

A pergunta me pegou de surpresa, porque não tinha comentado com ninguém que pensava em não apresentar. Minha reação foi de psicologia reversa:

– Como assim? Eu pretendo apresentar como todo mundo. – respondi

– Ah, mas você não deveria. Você não vai conseguir falar em público. Todo mundo tem vergonha, imagina você…   – Tenho certeza que o professor estava bem intencionado e queria me proteger, mas as palavras dele machucaram meu ego e, como eu detesto que me digam que eu não devo fazer algo por conta da deficiência, decidi naquele instante que eu ia apresentar o trabalho no auditório, fosse como fosse.

– Não deveria, mas vou e ponto. – Respondi eu, com um tom desafiador, que fez o professor não me dizer mais nada.

Na véspera da apresentação, caiu minha ficha. O auditório comportava mais de 200 pessoas, mas tinha uma péssima acústica. E, sem a referência de ouvir a própria voz, fica difícil acertar tudo: velocidade, altura. Somando isso ao nervosismo, as horas que antecederam a apresentação soaram como um pesadelo desperto.

Eu tinha chegado cedo à universidade. Queria sentir o ambiente e esperar pra um milagre acontecer, porque o pavor tomava conta de cada poro do meu corpo. Quando faltava pouco mais de duas horas pra apresentação do trabalho, senta um professor antigo meu – tinha me dado aula no quinto e sexto semestre – na minha frente e pergunta do meu TCC. Respondi:

– É hoje! E eu cometi a audácia de dizer que ia apresentá-lo no auditório. Só porque falaram pra eu não fazer isso. E você sabe, eu fico corada até de falar em sala de aula.

Ele olhou pra mim com um carinho e ternura absolutamente estampado na cara dele e disse:
– Esquece o TCC, esquece o auditório, esquece as pessoas. Sobe naquele palco e fala comigo. Eu faço questão de estar na plateia. Você fala o que tem que falar só pra mim. Não importa que você fale rápido, devagar, baixo, alto, EU vou entender o que você estiver falando, sempre te entendi, você sabe disso.

O tempo passou, meus pais, minha irmã, meu namorado, meu cunhado, minhas amigas que foram assistir meu trabalho, todo mundo chegou. 

E subi junto com as pessoas do grupo no palco. Um rapaz do grupo fez a introdução, apresentou a parte dele. Entregou o microfone pra outra menina, que apresentou a parte dela. E cada segundo que faltava pra minha apresentação, fazia com que o chão sumisse cada vez mais, sob meus pés e o ar parecesse que me faltava dos pulmões.

Chegou a minha vez. Peguei o microfone tremendo absurdamente e comecei a falar. Pro meu desespero, a voz não saiu. Minha voz é absolutamente emocional e, naquele instante, eu estava à beira de um colapso nervoso. Olhei pra minha mãe na plateia, vi os olhos dela encherem d’água, porque ela percebeu que a voz travou na gargante. Eu olhei pra banca de professores – com direito ao que tinha mandado eu não apresentar – respirei fundo e procurei o Luis Fernando (era esse o nome do professor que tinha me acalmado antes do trabalho) que estava sentado no fundo do auditório, com o olhar mais sereno do mundo. Ele fez um movimento com a cabeça, surpreendentemente acolhedor e eu me acalmei e disse:

– Perdoem-me, eu estou nervosa. Sou deficiente auditiva…

Quando falei isso, senti que minha voz tinha voltado ao normal e sorri. Um simples olhar de alento tinha me proporcionado o milagre que eu estava esperando.

Apresentei o trabalho da maneira que precisava, com a voz calma, na altura certa, falando o que precisava dizer e, quando acabou, até fiquei surpresa de como tinha sido rápido.  Falei que outra pessoa iria apresentar a etapa seguinte e virei pra dar o microfone pra ela. Ela pegou o microfone, olhou pra mim e disse:

– Olha!

Virei para a platéia e o auditório inteiro aplaudia, muitas pessoas de pé, incluindo os professores. Tanto aquele que tinha me apoiado, quanto aquele que tinha me desafiado.

No final do trabalho, os professores elogiaram o trabalho, mas todos deram atenção especial pra minha coragem. Um dos professores fez questão de falar que tinha me incentivado a continuar, porque eu tinha pensado em desistir durante o curso. Outro me deu parabéns. E o que tinha falado pra eu não apresentar, disse que eu tinha dado uma lição de coragem a ele.

Luis Fernando, que não estava na banca, já que não era professor do último ano, deu um jeito de pegar o microfone para me dar parabéns também. Fez questão de contar da nossa conversa antes da apresentação e dizer que tinha encontrado uma menina com medo, mas que era capaz de mover montanhas e que ele nunca tinha duvidado disso.

No fim, a moral desse texto é apenas dizer: Seja corajoso. Mesmo que você não seja, finja ser. Ninguém nota a diferença.

Beijinhos

Lak

38 Resultados

  1. Agnaldo disse:

    Que exemplo de coragem e determinação ! Isto só reforça minha crença de que a força de que necessitamos encontra-se justamente dentro de nós, apenas nos esquecemos dela nos momentos de atribulação… Felizmente, de onde menos esperamos encontramos estímulo para não desistir e seguir em frente. Esta passagem remonta à situação pela qual passei em 2005 nos Estados Unidos. Estava desenvolvendo um projeto de melhoria de processos no centro de distribuição da empresa localizado em Miami e ao participar da reunião de fechamento com os diretores e gerentes, eu simplesmente não entendia o que um dos participantes falava (creio que por conta da acústica do ambiente aliado ao fato de que ele falava num tom de voz muito baixo). Controlei meu pânico e “rezei” para que pudesse contornar a situação satisfatoriamente. Por sorte, após minha exposição, este interlocutor não me fez perguntas e tudo transcorreu bem. Naquele momento, não me senti confortável em revelar minha deficiência, por temer a reação das pessoas. Hoje em dia, encaro de forma mais natural, especialmente depois de conhecer este blog. Por meio dos relatos e troca de experiências, tenho encontrado referências úteis e edificantes e – mais importante – estímulo para vencer as barreiras do dia-a-dia. Valeu, mesmo Lak !
    :o)

    • Avatar photo laklobato disse:

      Agnaldo, a sua amizade é importantíssima pra mim, mas sendo sincera, se você não falasse que tem deficiencia auditiva, eu jamais perceberia…
      Beijinhos

  2. Adriana disse:

    Lak, fiquei uns dias sem me manifestar, mas te visitei todos os dias. Hoje seu texto exige que eu deixe o meu recado. Fiz a leitura com o coração disparado, querendo sair pela boca… Menina, acredite no seu potencial para escrever e emocionar, na sua capacidade de se comunicar, de descrever e despertar os sentimentos… O mundo precisa de gente assim… Beijos.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Hehehe obrigada, Adriana. Coração saindo pela boca foi exatamente a emoção que eu sentia. Mas não encontrei essas palavras na hora que fiz o texto… Tá vendo como comentários são importantes? Gosto quando vocês completam meu texto, com o que faltava… Beijinhos

  3. renata disse:

    Oi Lak, professores assim fazem a diferença em nossas vidas. Parabéns pela coragem. beijos

    • Avatar photo laklobato disse:

      Fazem mesmo. Mas mesmo ao que me desafiou, eu sou grata. Deixei um recado no orkut dele, agradecendo pela força que ele me deu, sem saber! Não são só as pessoas que nos elogiam que fazem a diferença, né? Beijocas

  4. Bia disse:

    Muito bacana sua história Lak.
    Engraçado que quando estamos com medo de algo o momento demora a chegar, mas depois que passa vemos que não foi tão difícil assim.

    Beijo pra tu!

  5. Maíra disse:

    Novamente vc faz me emocionar. Se vc me pagasse 1 centavo por cada lágrima, ficaria rica, sem dúvida !!! 🙂
    Lindo, lindo!! 🙂 Um dia te conto como foi a minha!!
    beijinhos

  6. Aldrey disse:

    Oi Lak,amei essa tua foto me passou algo tão bom,uma paz..E quanto atua história achei linda,nossa ate chorei,pq eu viajo nas histórias,parece que to sentada na primeira fila!!mulher corajosa que vc é hem??fica com DEUS bjssss 🙂

    • Avatar photo laklobato disse:

      Hehehe obrigada pelo comentário da foro, Aldrey! Tava na dúvida se teria sido boa escolha.
      Mas, não é bem coragem, eu apenas tenho a constante necessidade de provar que tudo é possível.
      Beijo

  7. Lakinha, ocê ponhou água nos zóio de Sinhá hoje. Lindo dimais da conta seu causo, sua corage, um abraço apertaaaaaaado cheio de admiração d’ocê viu?
    Parabéns pra sua mamãe e papai que fizero e criaro ocê tão bem.
    Beijim

  8. Bruna disse:

    Linda história Lak!
    Felizmente eu faço parte dos 2% da população que não tem problema em falar em público. Mas é incrível como a coragem surge nos nossos momentos de “teimosia”. Eu sempre brinco que não faço as coisas por coragem, mas por teimosia mesmo. Porque se alguém me diz que não posso, aí sim que eu faço, e faço tão bem (ou melhor)quanto qualquer outra pessoa faria.
    Às vezes a gente precisa de um cutucão, um desafio, um momento de mágoa até, para sabermos do que somos capaz!
    Bjs

    • Avatar photo laklobato disse:

      Exatamente… acho que se ninguém tivesse me dito que eu não era capaz, não haveria necessidade de provar o contrário. Por isso, sou grata pelo desafio!
      Inveja de quem não tem vergonha de falar em publico hehehe
      Beijinhos

  9. Juca disse:

    tb gostei demais da estória, Lak!

    (tb preciso superar meu medo de panela de pressão 😛 … é que eu sou distraído demais!… tb desde sempre – inclusive professores! – diziam: “vc é distraído demais!”… acabei incorporando essa acusação! :|… então hj eu tenho medo de mexer com panela de pressão… e muitas vezes, já saindo de casa, eu volto pra confirmar se tirei mesmo o ferro de passar da tomada! 😥 )

    beijos!!! 😉

    • Avatar photo laklobato disse:

      Também tenho pavor de panela de pressão. Lamento, mas não vou conseguir te ajudar a se livrar de um medo que eu tb tenho hahaha
      E eu volto pra casa, pra confirmar se fechei a torneira do banheiro!!
      Beijinhos

  10. Edelson disse:

    Olá Lak,

    Parabéns pelo texto, mais um vez nos deixa emocionados. Parabéns também pela superação. Muitas coisas em nossas vidas acontecem por causa de desafios que as pessoas nos impoem e nós aceitamos. Sem esses desafios, muita coisa não poderíamos experimentar, e ainda mostrar que somos capazes.
    Falar em público realmente é complicado. Pelo menos para mim, hehehe. Mas sabe, depois destes 4 anos e meio de faculdade (estou encerrando agora) isso começou a mudar em mim, já que foram exigidas algumas apresentações de mim, até em congressos nacionais.

    bjus

  11. Edelson disse:

    Graças a Deus, a apresentação do meu TCC, apesar do nervosismo, foi ótima. As outras apresentação ficaram entre regular e boa. Mas, o que faltava, às vezes, era um pouco mais de confiança e estudo!

    • Avatar photo laklobato disse:

      Praticar ajuda mesmo… Que bom que você tem conseguido deixar o medo de lado e se tornar bom nisso… Quem sabe, chego la, um dia?
      Beijinhos

  12. Elias disse:

    Emocionante sua história, adorei. Parabéns.

  13. Sba eLakinha, eu entendo perfeitamente o que você passou. Meu problema nunca foi a surdez, mas ism um probleminha psicologico que se chama FOBIAL SOCIAL. Eu tomo remedios pra controlar isso há muitos anos, mas é impossivel não ficar nervosa e perder a voz quando preciso apresentar algo. No Ensino Médio aqui nos EUA os professores diziam que se eu quisesse eles me dispensariam de apresentações de seminários e tudo mais, mas sempre insisti e tentei passar por cima do medo. O pior é que o problema sempre aumentava, porque eu tinha medo de me fazerem perguntas e eu não ouvir, então só ficava mais ansiosa, mas sempre fui com a cara e a coragem e me apresentei. Nunca dexei que essas coisas me dominassem, e muitas vezes também fui aplaudida de pé no auditório da escola. Até hoje tenho amizade com meus professores e eles me elogiam horrores e sempre falam de mim pros alunos deles.
    Beijos

    Ps: Postei no Blog.

  14. Jairo Marques disse:

    Aff… num guentei, não, Lak… dei uma choradinha…. beijos e brigado pela história… sensacional.

  15. Isa Grou disse:

    Que lindo post Lak!

    Parabéns, viu!
    Pelo belo exemplo que vc deu a todos.

    Beijos.

  16. Rogério disse:

    Doida de pedra, adoro sua pena. Adoro também sua determinação, essa coragem de não levar desaforo para casa, esse senso de dignidade que é um tapa na cara de quem faz da desistência a primeira e mais cômoda opção. Quando tiver um tempinho dê uma passada no meu cafofo, parece que de alguma forma falamos da mesma coisa por meio de situações diferentes.

    • Avatar photo laklobato disse:

      Tô te devendo visita, né? Verdade…. Mas não esqueci de você não!!
      Pois é, mais que coragem, eu tenho a necessidade constante de mostrar que sou capaz de tudo. E não pense que é por causa da surdez, eu já era assim antes, apenas ficou mais acentuado, quando o mundo me passou a ver como uma coisinha quebrada. hehehhe
      Beijinhos

  17. Mariana disse:

    Lak!!!

    Parabéns pelo texto!!
    E tb pela tua superação! É isso aí, temos que mostrar que somos capazes!!
    Tb passei por isso, mas nem cogitaram em dispensar a apresentação, nem tocaram no assunto…
    Cheguei lá na frente, tava suuuper nervosa, mas quando peguei o microfone e comecei a falar, nem falei nada de deficiência, a maioria me conhecia e comecei a ficar mais tranquila… Tanto que uma das professoras que me deu aula uns semestres antes, comentou no final, que eu estava tão tranquila, que parecia que eu tava dando aula… Nossa! Me surpreendi comigo…
    Tem situações nesta vida que a gente acaba nos surpreendendo com nossa capacidade, não?
    Na formatura a paraninfa começou a falar de cada um e vi que ela não mencionava meu nome… daí eu fui a última pessoa que ela comentou. Ela disse que não tinha esquecido de mim, e falou palavras muito bonitas, do tipo de eu servir como exemplo de superação e etc… nossa, chorei!!! Imaginem! Formatura já é um grande passo em nossas vidas e ainda mais com as palavras lindas dela… MELDELS!!!! Hehehehe…
    A gente é o máximo, não?
    Beijos!!!

  18. Raul disse:

    Que legal. De uma certa forma, a nossa surdez as vezes se torna mais psicológica do que real. Explicando melhor, quando nos deparamos com situações tipo essa, parece que a voz não sai ou sai toda errada. Eu já apresentei meu TCC e foi bem legal por que a minha orientadora sugeriu que eu usasse o microfone que a minha voz saía mais clara e mais alta, já que eu pela timidez tenho tendência de falar mais baixo. No começo, fiquei muito nervoso mais com o tempo me soltei e apresentei o TCC direitinho. Uma amiga minha até comentou: “Nossa, vc até que tem uma desenvoltura para apresentar de frente pra turma.” 😀

  19. Miriam disse:

    *sorriso imenso, imaginando a cena*

    Sem comentários. Vc é especial.

  20. Crisaidi disse:

    Puxa, Lakshmi, você é durona!

    Você não chorou quando esse prof disse para você esquecer tudo e todos e falar para ele?

    Ah, eu sou “derretível”! Eu choraria com direito a uns quatro lencinhos de papel. (Puxa, Crisaidi, engraçado usar uma graduação – “x” lencinhos de papel! 😀 )

    Aquele que sugeriu a dispensa, como você disse, foi com carinho – esse carinho “trop”, “too”, “demasiado” que até estraga, mas todo mundo quer um pouquinho, não é? Mas para uma lutadora, serviu como desafio. Valeu! Como você disse ele ajudou sem saber/querer!

    Beijinhos, Crisaidi 🙂

    • Avatar photo laklobato disse:

      Eu estava nervosa na hora, não chorei não, apenas fiz o que ele mandou hehehe. Funcionou!
      O outro… bom, é aquele lance de empurrar a cadeira, né? Sem perceber que esse tipo de ajuda caleja!
      Beijos

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