Eventos mais acessíveis com legenda ao vivo

Uma das maiores reclamações que ouço, dos surdos oralizados, é a dificuldade de encontrar acessibilidade em eventos e palestras. Geralmente, o recurso oferecido são os intérpretes de Libras, que apesar de uma excelente forma de inclusão de surdos, não contempla as necessidades de todas as pessoas com deficiência auditiva. Principalmente aquelas que são fluentes em língua portuguesa e usam apenas a comunicação oral.

Para suprir essa demanda de acessibilidade, existe o trabalho dos estenotipistas, do qual já falei algumas vezes no blog. Porém, nem sempre esse profissional é financeiramente acessível para a maioria das pessoas. Eu mesma, achava que era apenas um sonho distante.

Há algum tempo, uma amiga de facebook solicitou indicação de digitador para acompanhá-la em sala de aula. Ela é surda oralizada de nascença e sabe o básico da Libras,  mas não é fluente. Então, ela queria/precisava de acessibilidade em português escrito. E ela passou a assistir as aulas com uma legendadora ao vivo!

Tempos depois, eu fui convidada para dar uma palestra em Volta Redonda (RJ) à convite da Dra. Roberta Laurindo, da equipe que implanta na região. E, atendendo a pedido dos convidados (inclusive a própria Gabriela, a menina que citei no parágrafo anterior), foi oferecido o serviço de legenda ao vivo. O que foi um sucesso, repetido no evento da equipe do Centro Carioca de Implante Coclear (Rio de Janeiro).


Queria, então, compartilhar com vocês a história da Denise Lima, uma jornalista que decidiu virar legendadora, para tornar os eventos e aulas mais acessíveis para surdos oralizados:

Conte um pouquinho de você, pra gente te conhecer melhor.

Oi oi. Meu nome é Denise e tenho 31 anos. Nasci no estado do RJ mas adotei SP como minha casa de coração. Sou formada em jornalismo, estudei patologia e também fiz confeitaria. Eu gosto de estudar, deu pra ver né? Também estudei designer e consultoria empresarial. Haha Recentemente, por conta de um trabalho, me descobri na digitação e amei.

E como você veio parar nesse mundo?

Eu estava desempregada e vi um anúncio de teste para um trabalho de digitação. Não tinha muito detalhe mas eu estava precisando e fui. Quando cheguei lá conheci a Gabriela e entendi a necessidade dela. Ela fazia faculdade e precisava de alguém que digitasse as aulas para ela. Tinha muita gente no teste. Eu sai de la achando que tinha ido muito mal mas acabei sendo escolhida. Eu achava que a galera batendo no teclado freneticamente significava que estavam indo bem. Rs. Mas não.

Como foi enfrentar esse novo desafio? Como você encarou essa mudança de carreira?

Olha, como eu disse, sempre gostei de meter a cara em tudo. Meu maior medo foi de cumprir a necessidade da Gabi. Porque já imaginou digitar algo nada a ver? Eu não entendia nada de engenharia e tinha que digitar um monte de termo técnico para ela. Eu fiquei dois dias sem dormir. Eu achava que não ia conseguir de jeito nenhum. Mas o que me motivou foi a história dela. A força de vontade e tal. Eu achava que se alguém ouvisse, era óbvio entender. Como poderia? Fiz o que sei fazer de melhor: perguntei. Quando eu entendi tudo a coisa fluiu melhor. Foi mágico.

No final das contas, você acabou se formando em engenharia junto com ela? haha

Haha foi uma pena que peguei no final porque foi muito divertido. Eu tirei muita dúvida e no final o professor me achava a “aluna” mais aplicada. Infelizmente não foi esse mar de rosas. Tivemos muitos problemas com os outros alunos.

Além da Gabi, você trabalhou com outros alunos surdos?

Não. Gabi foi a única aluna. Eu continuo com ela na pós graduação e meu contato agora é com eventos.

Então, conte um pouco dos eventos…

Então, também pela Gabi , fui chamada pro evento em Volta Redonda. Foram mais dois dias sem dormir. Eu fiquei pensando se não ia passar vergonha. Como era um evento curto, me joguei. E deu super certo. Aí eu vi que poderia ajudar mais pessoas. Tinha muito mais gente precisando do que eu tava fazendo e eu nem me dava conta. Conversei com mais algumas pessoas, tem uns projetos rolando e estão me chamando para mais eventos. Então acho que estou fazendo certo, não é?

No final de cada evento eu recebo um abraço de cada pessoa, sempre vem alguém me dizer: nossa você digita tão rápido. Quando eu escuto que ajudei alguém e que o evento foi melhor por minha causa, vejo que to no caminho certo. É gratificante.

Como é feito seu trabalho exatamente? O que é preciso para você fornecer o serviço?

Eu não sou estenotipista. Para isso é preciso curso, equipamento, etc. O que eu faço é uma digitação rápida. A ideia é ajudar quem precisa entender o que tá sendo dito. Minha digitação tem um atraso médio de 3 segundos e consigo acompanhar bem. Com isso, se você não consegue ouvir, vai conseguir saber o que tá sendo dito no local. Para trabalhar eu uso o meu notebook pessoal. O único recurso que preciso em caso de eventos é um projetor só pra mim. Estou formulando um sistema para facilitar isso e para juntar a apresentação dos palestrantes à minha legenda, na mesma projeção. Mas enquanto isso, eu preciso de um projetor só pra mim. Além se uma cadeira com mesa e uma tomada, né? De resto, eu só digito. O mais rápido que eu posso.

E quais os principais desafios desse trabalho? Já passou por alguma situação embaraçosa?

Eu tenho pavor de digitar algo errado. Claro que sempre tem erro de digitação, abreviação, essas coisas. Mas toda vez que vou num evento eu pergunto se vão falar algum termo técnico. Toda vez que vou digitar “coclear”, me dá um negócio, porque digitar isso rápido não é fácil. Ainda mais que não é uma palavra comum pra mim. Entendam, eu não fazia nem ideia de como era até menos de um ano atrás. Mas eu tenho uma boa história pra contar… como eu ficava todo dia com a Gabi, criamos uma amizade. Às vezes, na aula, eu digitava algo pra ela, em off. Tipo eu falando com ela. Num desses dias, eu fui contar uma fofoca pra ela, num momento de pausa da aula e ela achou que era o professor falando aquilo. Logo que ela leu, perguntou alto sobre aquilo e eu gritei na hora. Ela não podia falar alto aquilo. Hahaha a gente quase morreu de tanto rir. Agora sempre que quero contar algo assim eu escrevo “off” antes. Melhor não arriscar. Haha

O outro desafio envolve pessoas ouvintes. Infelizmente as pessoas não têm empatia com nada. Aconteceu muito de reclamarem de mim na aula. Que eu perguntava, atrasava a aula, etc. Mas ninguém se preocupava que eu estava perguntando por alguém que não podia ouvir para entender. Como eu explico algo pra alguém se eu não entender? As pessoas chegaram num ponto de reclamar com professor sobre mim. Achei tão desumano. Fiquei muito triste quando soube, porque se colocar no lugar do outro é primordial. No dia da monografia dela que um professor leu a ata de frente pra ela, falando devagar e pensando exclusivamente nela, eu chorei litros. Foi lindo.

E para quem quiser contratar seus serviços, onde você atende e quais são seus custos?

Bom, eu moro no sul fluminense e adoro viajar (rs). Eu consigo atender qualquer lugar que me dê passagem, abrigo e comida. Normalmente eu tenho valores por hora mas é negociável. Cada evento é diferente do outro e eu penso muito nisso. Para eventos próximos eu peço o valor de deslocamento e o valor do trabalho. Para locais mais distantes preciso calcular minhas necessidades de transporte, de dormir (caso precise de mais de um dia) e comer.

  • Contato da Denise Lima: (24) 99201-6511

Super indico!

Beijinhos sonoros

Lak Lobato

2 Resultados

  1. Renata disse:

    Olá Lak! Adorei a matéria! Tentei salvar o contato da Denise Lima mas não aparece como WhatsApp.

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