Implantado até embaixo d’água: a história de Rafael

Implante coclear e vida aquática? Será que é possível?
Quem conta a aventura de usar IC e viver no mar é o guia turístico Rafael Cavalcanti:

Em 2016, indo para uma cidade a 80 km da minha casa, dirigindo meu carro, tentei atender por duas vezes meu telefone. A pessoa me passou uma mensagem de texto dizendo por que estava desligando na cara dela. Retornei a ligação usando o outro ouvido e aí descobri que algo tinha acontecido com meu ouvido esquerdo, mas continuei trabalhando normalmente. Ao retornar à minha casa, não comentei o que tinha acontecido. No dia seguinte, fui ao otorrino para tentar entender o que tinha acontecido. E começa assim, minha peregrinação. E mal tinha noção do que estaria por vir (muita medicação e vários médicos, muitos exames, que nem sabia que existia). Tomei medicamento e, nesse tempo ouvia somente de um lado. Era muito chato, pois precisar virar a cabeça para tentar ouvir o que a pessoa do meu lado falava. Mas, as táticas já vinham: trocava logo de lado quando percebia  que não iria ouvir nada que a pessoa falava no ouvido surdo. Às vezes, dava uma mancada de tentar atender o telefone do lado que não ouvia nada, eram várias risadas com isso!! Depois de uns 20 dias, acordei às 4h30 como de habitual e liguei a TV do meu quarto para fazer um barulho e atualizar das informações do dia à dia. Ai veio o pior: parecia que ela estava no mudo. Só que não! A TV estava no volume 98 e não ouvia absolutamente nada! Meu pai acordou com o barulho e eu só via ele falando e não ouvia nada. Ele acordou minha coroa que tentou entender o que estava acontecendo. Falei que não ouvia mais nada! Logo pensei que poderia  ser pressão alta. Logo corri no aparelho de casa e aferi a pressão (1,8 foi que o ele marcava), pensei que poderia ser um pico de açúcar no sangue (todos por parte de mãe).  Fiz o exame em casa e o resultado deu 110, super normal. Eles queriam ir no hospital naquela madrugada e eu falei que o pior já tinha acontecido. Eu disse: vamos dormir e no amanhecer vamos voltar ao otorrino. E assim fomos no otorrino, que me falou que todos os exames não davam um diagnóstico, pois todos não apontavam nada anormal.

Daí mais exames e mais medicamentos. Fui até ao Rio para fazer alguns exames que na minha região iriam demorar meses. Eu solicitei à empresa, onde trabalho há mais de 10 anos, a não parar de trabalhar. Lá sou instrutor de turismo e coordenador de curso. Assim foi feito! Escutei  que estaria passando isso tudo por estresse e que não queria deixar o cargo para outra pessoa e foi muito chato saber disso, pois não ouvia nada. Teve umas vezes engraçadas que para tentar sair com uma garota já mandava uma “olha vou precisar fazer uma leitura labial bem de pertinho! E nesse tempo tinha gente que me perguntava: “Mas Rafa, como você dirige assim, surdo?” Eu chegava a mandar um “Né”, sentado atrás de um volante, pois sou só surdo,  não sou cego. Também, vieram ajudas de várias pessoas que nem imaginava, como uma sacola cheia de aparelhos auditivos. Quando peguei a sacola cheguei a chorar de tanta emoção, pois as pessoas estavam tentando me ajudar de qualquer forma. Duas pessoas me indicaram a policlínica de Botafogo, uma colega de trabalho de Macaé e outra do Rio.

O tempo passou e o otorrino de Cabo Frio me passou para fazer os testes com aparelhos convencionais (uma turnê que fiz). Foram aparelhos de R$500 a R$28 mil e eu assustava com os valores. Usava, mas não conseguia atender o telefone e como eu era ouvinte normal , eu queria voltar a ouvir como antes, podendo ver uma TV e atender o telefone, dar aula e guiar meus grupos onde até hoje é minha cachaça, essas duas atividades. Num domingo de sol, acordei e falei com meus pais: Vou à Policlínica e quem quiser que venha comigo. Em 10 minutos, os dois estão arrumados. Chegamos lá, fui muito bem atendido por uma médica otorrino do plantão e pediu para voltar depois de 15 dias, marcando com o especialista Dr. Marcelo Tepedino Júnior. Assim fiz. Voltei e fui atendido por ele. O Marcelo jogou um banho de água fria. Me passando que eu era deficiente auditivo e me indicou a testar mais aparelhos convencionais.  Disse: Use todos e não compre nenhum. E me indicou a uma fono, Dr. Leny Meirelles , que começou a me explicar como seria a minha indicação ao implante. Assim fiz. Na data marcada, voltei e ele fez uma pergunta: “Rafael como você está, está ouvindo melhor?” Falei que não, pois como era ouvinte usando do aparelho mais barato ao mais caro, precisava fazer a tal leitura labial onde até perguntei a você onde tinha curso e você falou que não existia.  Você lembra? Daí ele me apresentou o implante coclear. Abriu uma bolsa preta mediana e tinha vários equipamentos.  Olhei aquilo tudo e fiz uma pergunta do Milão para mim: “Como vamos colocar isso?” A resposta foi por processo cirúrgico. Bateu aquele calafrio mas falei: Vamos fazer quando? A minha vontade de voltar a ouvir era grande. Ele pediu mais exames. Fiz tudo em tempo recorde e ele ficou espantado com a velocidade e marcamos a primeira cirurgia. No dia anterior, meu pai veio a falecer. Agora não tinha uma perda de som e sim a perda do meu velho. Me culpava, pois foi um ataque do coração. Depois de um mês remarcamos a primeira cirurgia  para o dia 4 de setembro de 2016. No centro cirúrgico antes de tomar a tal geral que tinha maior medo, fiz uma pergunta a equipe: Quem vai fazer o curativo? Daí no final da sala levanta a mão uma enfermeira. Falei: Olha faça o melhor turbante que você já fez nesse hospital. 4, que para mim é um dia marcante, porque dia 4 foi o dia que eu fiz a ativação do implante coclear.  E no dia 4 do outro mês, eu mergulhei com o implante e digo a você que hoje nesse dia internacional eu só venho a agradecer. E aí o agradecimento de todo mundo que passou ao meu lado em 8 meses de silêncio. Queria agradecer especialmente aos meus coroas Olga Cavalcanti e Luiz, meus parentes, enfim, aos meus colegas do trabalho, que tiveram a paciência sem limites. Aos amigos também, e colegas do turismo, e especialmente a duas pessoas de São Paulo que são a Mariana Pires Costa e o Paulo Henrique Santos. Meus agradecimentos a um simples grupo do WhatsApp, que quando eu entrei eu falei como eu fiquei surdo, e daí todos me acolheram de forma muito prazeirosa. 3 pessoas pessoalmente.  A primeira, a Renata Orsi, que mora lá nos Estados Unidos, que me adicionou e me deu apoio. O segundo, Tiago Santos, de Volta Redonda, que quando ouviu a história de primeiro já me doou um aparelho auditivo sem me conhecer. E terceiro, a Juliana Teixeira Moreira, que de um gesto tão proativo vendo a outra entrar no universo do implantado, teve maior boa vontade de me encontrar no centro e mostrar uma coisa que eu não tinha ouvido falar antes de perder audição e depois que eu perdi eu consegui observar, que ficar no silêncio é só para quem quer. Queria também agradecer as fonoaudiólogas e entre elas, a Tati Filippe  do Rio Grande do Sul de Porto Alegre, que numa busca da internet eu consegui localizar a loja dela e ela teve a maior boa vontade de explicar a minha mãe por telefone como é que eram os aparelhos auditivos e deu várias dicas. Também, a Gisele Aquino da phonak do Rio, que teve maior carinho e atenção em me explicar se estava bom ou se estava ruim. E sabendo que eu era um candidato a implante coclear, também uma pessoa que mora na região serrana, a Perla Consuelo Ferreira Silva, que não vou mentir, me surpreendeu em vários aspectos de uma hospitalidade imensa. Meu agradecimento não pára só nessas pessoas. Tem também um lugar acolhedor e de uma hospitalidade imensa, que desde o primeiro domingo aproximadamente às 18:00, que eu entrei na #policlinicadebotafogo e até hoje sou atendido da mesma forma. O pessoal da portaria, por dar um bom dia, um boa tarde e uma boa noite. Ainda, ao atendimento pré-cirúrgico e pós cirúrgico e claro, a duas pessoas que hoje devo por estar ouvindo melhor do que eu imaginava, ao  Dr.  Marcelo Tepedino, excelente cirurgião, brother gente fina pra caramba e a outra pessoa, especialmente a uma fonoaudióloga que tiro o chapéu, a minha madrinha sonora, Leny Meirelles  Ela foi de uma paciência,  um carinho, uma atenção fora do normal. Agora você que tá pensando ou já é candidato ao implante coclear eu digo a você, pensamento positivo, siga sua intuição pois logo logo você vai  ouvir e ouvir bem. Um abraço a toda família cyborg.

Todo os transporte turísticos abro minha fala com o tal bom dia de guia. Quando digo “Quero um o bom dia mais alto que vocês podem me dar”, chego a falar que até surdo ouviu. Falo sempre “olha, brincadeiras a parte, o Rafa aqui é surdo usuário de implante coclear”…

Rafael Cavalcanti

Beijinho sonoros
Lak

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