Surdos Oralizados e o Mercado de Trabalho

Diferentemente do que muitas pessoas imaginam, pessoas com deficiência auditiva não se resumem a surdos que utilizam a língua de sinais. Embora essa população seja visível e bem reconhecida, há inúmeras pessoas que lidam com a deficiência de outra forma e que utilizam outras vias de comunicação.

Pensando nesse desconhecimento da sociedade sobre adultos com deficiência auditiva que não se comunicam preferencialmente em língua de sinais, realizamos uma pesquisa com um grupo de 629 pessoas com algum grau de deficiência auditiva, de todo o Brasil.

As perguntas foram feitas principalmente para traçar um perfil sobre a comunicação utilizada e a presença dessas pessoas no mercado de trabalho.

Segundo a análise dos dados:

Tipos de surdez: 84% alegou possuir deficiência auditiva bilateral e 16% alegou deficiência auditiva unilateral.

Como existe diferenças significativas entre a surdez unilateral da surdez bilateral, principalmente no que se refere a desenvolvimento de linguagem e disparidade de uso de tecnologias, a analise da pesquisa foi separada em dois grupos.

Dentre os surdos bilaterais:

Graus de perda auditiva bilateral: 22% possuem perda moderada 25% possuem perda severa 53% possuem perda profunda

O uso de tecnologias foi observado em pessoas com todos os graus de perda, sintetizado na amostragem total de bilaterais, foi contabilizado:

10% Não faz uso de nenhuma tecnologia 54% Utiliza aparelhos auditivos convencionais (AASI) 36% Utiliza algum tipo de tecnologia implantável

A língua materna de 92% das pessoas é a língua portuguesa e 88% utilizam sua versão oral como principal forma de comunicação. Em contrapartida, apenas 3% declararam utilizar a língua de sinais como forma de comunicação principal. Sendo que 76%  alegaram não ter conhecimento em Libras.

A principal forma de comunicação declarada pelos respondentes com perda bilateral é de 88% Língua Portuguesa Falada, 9% utiliza língua portuguesa falada e também a língua de sinais e 3% utiliza a língua de sinais como principal forma de comunicação.

A leitura labial, bastante subestimada como forma de comunicação eficiente, é utilizada por 87% das pessoas, como principal forma de comunicação ou como complementar seja da tecnologia utilizada ou da língua de  sinais.

Sobre a formação acadêmica, obtivemos as seguintes porcentagens:

Formação: 60% possui curso superior ou pós graduação e 13% está cursando curso superior atualmente. E 27% não tem formação superior.

Atualmente, 70% das pessoas que responderam a pesquisa está empregada. Deste público, 56% trabalham na sua área de formação e 78% deles sentem-se incluídos na sua equipe de trabalho e  ainda 70% respondeu que sua liderança respeita seu trabalho e o vê como profissional qualificado.

Uma questão que foi abordada na pesquisa era a forma como cada pessoa preferia que as tarefas fossem demandas, uma dúvida frequente de profissionais que trabalham em times que possuem pessoas com deficiência auditiva. Os dados mostram que:

40% prefere que as tarefas sejam demandadas por escrito (por email, memorando ou programa de conversação instantânea) 33% prefere receber tarefas verbalmente 27% disse que é indiferente

Ou seja, não há um consenso nesse sentido, é algo que depende do trabalho realizado e do perfil da pessoa, independentemente do grau de perda auditiva.  Isso reforça a importância do diálogo entre a liderança e o profissional, para que encontrem juntos a melhor forma de demandar tarefas.

Também foi perguntado sobre os tipos de ferramentas de acessibilidade que o grupo gostaria de poder contar no trabalho, algo frequentemente ignorado já que surdos oralizados em geral, estão bem integrados nas equipes e são facilmente confundidos com ouvintes que não necessitam de acessibilidade. No entanto, isso não é verdade e apenas 1% alegou não precisar de nenhum tipo de adaptação ou recurso de acessibilidade.

O pedido mais recorrente era: 60% gostaria de ter legenda em todos os materiais de multimídia, treinamentos e palestras. Mesmo em reuniões menores, também gostariam de poder contar com alguma tecnologia que transcreva os diálogos.

Além disso, também foi citado:  Intérprete de Libras, microfone de transmissão de áudio e videoconferência de alta qualidade que permita leitura labial complementar do áudio.

Dentre as pessoas que estão procurando ou procuraram vagas de emprego em algum momento, 40% respondeu procurar apenas vagas exclusivas para profissionais com deficiência. O restante procura vagas de acordo com seu perfil profissional, independentemente de serem vagas exclusivas ou não.

E dentre eles, 70% (mesmo empregados), está aberto à novas oportunidades de trabalho, o que mostra que o profissional surdo oralizado, em sua maioria tem um perfil de profissional ambicioso e com vontade de crescer na carreira!

O segundo grupo pesquisado, composto por surdos com perda unilateral, possui um perfil que merece uma análise própria.

A respeito do grau de perda auditiva unilateral declarado:

Surdos Unilaterais Alegaram: 3% perda leve – 15% perda moderada – 18% perda severa – 64% perda profunda

Apenas 29% do grupo utiliza algum tipo de tecnologia auditiva e 62% declarou não utilizar a leitura labial como forma de comunicação.

Sobre o uso de tecnologias auditivas: 71% declarou não fazer uso de qualquer tecnologia auditiva – 17% utiliza aparelhos convencionais – 12% utiliza tecnologias implantáveis.

O porcentagem de pessoas que declaram ser a língua portuguesa seu idioma materno é igual ao do grupo de surdos bilaterais: 92% tem português nativo. Também 92% declarou não ter conhecimento em língua de sinais, sendo a língua portuguesa falada a principal forma de comunicação utilizada pelo grupo: 96%.

Porém, o talento para leitura labial não é tão corriqueiro entre os surdos unilaterais. 62% alegou não utilizar a leitura labial em momento algum. Um dado relevante comparado aos 87% dos bilaterais que dominam essa técnica.

Em relação à formação acadêmica, houve diferença significativa entre os bilaterais e unilaterais:

Apenas 43% possui curso superior ou pós graduação (paralelamente os 60% dos bilaterais), 37% não possui estudo superior e 20% está cursando atualmente.

Apesar desta diferença, 65% está empregada atualmente e, destes, 78% declarou sentir-se incluído em sua equipe de trabalho e 64% acredita que a liderança o vê como um profissional qualificado.

Na questão de preferência sobre a forma de demandar as tarefas, a porcentagem de respostas segue similar ao grupo de surdos bilaterais

38% prefere que as tarefas sejam demandadas por escrito (por email, memorando ou programa de conversação instantânea) 27% prefere receber tarefas verbalmente 35% disse que é indiferente

Reforçando a percepção que essa preferência é mais pessoal que caraterística da deficiência.

Surpreendentemente, apesar de teoricamente terem melhor audição que os surdos bilaterais (já que perda unilateral implica ter uma audição normal no outro ouvido) 70% marcou a Legenda de materiais de multimídia, treinamentos e palestras como um recurso de acessibilidade desejado. Microfone remoto, telefones com conectividade com próteses auditivas também foram mencionados.

Dentre os surdos unilaterais, 94%  mesmo empregado, estaria aberto a novas oportunidades de emprego no momento. O que reforça a percepção de um perfil de pessoas ambiciosas e interessadas em desenvolvimento de carreira!

Lak Lobato

6 Resultados

  1. Adriano disse:

    Que trabalho incrivel, Lak!
    Parabéns pela pesquisa e esclarecimento! Adorei!!

  2. MUITO bom mesmo. Esclarecedor e muito útil. Estou divulgando com todo prazer.

  3. Nita Dircksen disse:

    Bacana Lak. Lembra do meu filho Henrique? Fez medicina e residência médica em neurologia. Trabalha em consultório próprio na cidade de Florianópolis/SC

  4. Paula disse:

    Lak, adorei fazer parte. Ainda não tinha visto o resultado.

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